No julgamento do recurso extraordinário 226899, a seguir reproduzido, iniciou o STF o reexame do entendimento acerca da questão relativa à incidência de ICMS sobre a importação de bem ou mercadoria que ingressam no país em decorrência de contrato internacional de arrendamento mercantil (leasing).
Com base, inclusive, em julgado anterior da Casa, têm os Tribunais assentado não incidir o tributo nessa hipótese[1], exceto se efetivada a opção de aquisição pela arrendatária, ante a inexistência, até aí, de operação a caracterizar a circulação jurídica do bem.
A eminente relatora, Ministra Ellen Gracie, única a votar na matéria até o presente momento, manifestou entendimento contrário ao assente na jurisprudência.
Destaques da Sessão
- Sustentação oral do recorrente, o Estado de São Paulo, feita pelo Procurador Marcos Ribeiro de Barros.
- Trecho do vídeo.
“Muito se tem discutido – e isso tem sido traduzido inclusive em inúmeras decisões monocráticas – que para a incidência do imposto na importação pelo regime de leasing, há a necessidade de ocorrer a opção de compra ao final do contrato, dado que aí estaria implementada a transferência de titularidade. Ocorre que no Estado de São Paulo, por um imperativo legal, na opção de compra está impedido - ele não exige o imposto.
- Sustentação oral do contribuinte recorrido, feita pelo Dr. Eduardo Lycurgo Neto
- Trecho do vídeo.
O ICMS é um imposto sobre a circulação de mercadorias. Esta Corte já decidiu, já tem entendimento consolidado de que a circulação de mercadorias pressupõe uma compra e venda. Se, no presente caso, o Tribunal Estadual diz que não houve opção de compra, então não há a base de incidência do ICMS.
O que o recorrente pretende é fazer equiparar o ICMS ao imposto de importação. Basta que uma empresa traga para dentro do País um bem, ainda que este bem não seja de sua titularidade, para que sobre ele incida o ICMS.
- Voto da Relatora, a eminente Ministra Ellen Gracie.
- Trecho do vídeo.
“(…)conquanto remanesça a circulação econômica como hipótese de incidência genérica do imposto, o legislador constitucional determinou a incidência específica do tributo sobre a entrada de mercadoria ou bem importado do exterior.”
O exame desse dispositivo revela que nessa circunstância a imposição de icms prescinde de verificação da natureza do negócio jurídico ensejador da importação. A constituição federal elegeu o elemento fático entrada de mercadoria importada como caracterizador da circulação jurídica da mercadoria ou do bem e dispensou indagações acerca dos contornos do negócio jurídico realizado no exterior.
(…) uma vez concretizada a importação mediante a entrada de mercadoria, tem-se por ocorrida a circulação econômica por presunção constitucional.
Do exame dos autos, concluo, portanto, que se houvesse a importação decorrido de contrato de compra e venda, a tributação exsurgiria indiscutível, sem que sequer se pudesse evocar a incorporação ou não ao ativo fixo para elidir a incidência tributária, já que a própria norma constitucional admite essa imposição. Assim, não me parece difícil perceber que o entendimento contrário, ou seja, o de que a operação externa de leasing não autoriza a cobrança de ICMS, levaria ao estímulo a que as aquisições de bens de capital passassem a ser feitas por esta via de ajuste para assim evitar a incidência tributária.
Ante o exposto (…), reconheço a constitucionalidade da incidência do ICMS sobre a entrada de mercadoria importada, qualquer que seja o ajuste internacional motivador da importação(…).
Notas
[1] No julgamento do RE 206.069 havia sido assentada posição idêntica à ora sustentada pela Ministra Relatora. Posteriormente, resultou da apreciação do RE 461.968 (caso TAM) o entendimento justificador da tese hoje vigorante. Eis exemplos de recentes decisões contrárias ao voto reproduzido no vídeo:
MANDADO DE SEGURANÇA - ICMS - ARRENDAMENTO MERCANTIL INTERNACIONAL - IMPORTAÇÃO- PRECEDENTES. MERCADORIA IMPORTADA SOB O REGIME DE ARRENDAMENTO OPERACIONAL (LEASING) - NÃO INCIDÊNCIA - SÚMULA 138/STJ - INOCORRÊNCIA DO FATO GERADOR DO ICMS.
Nos termos da lei e da jurisprudência, não incide o ICMS na entrada de bem no País em virtude de arrendamento mercantil internacional, ressalvada a cobrança do tributo se e quando a arrendatária efetivar sua aquisição.
Decisão reformada
ICMS — Importação de aeronave — Bem objeto de arrendamento mercantil - Incidência não reconhecida (art. 3º, VIII, da Lei Complementar 87/96) — Circulação de mercadoria não caracterizada – Art. 155, § 2º, IX, 'a', da CF inaplicável — Alegação de simulação de contrato de arrendamento mercantil não suficientemente comprovada e que não tem o condão de fazer incidir o imposto — Procedência - Decisão mantida — Recursos improvidos.
MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. Arrendamento mercantil. Isenção de ICMS. Sentença concessiva da segurança para que o apelado não recolha o ICMS sobre as operações de arrendamento mercantil, mantida. Aplicação do inciso VIII, do artigo 3o, da Lei Complementar n° 87/96. Não se trata da hipótese inserida pela Emenda Constitucional n° 33/2001 que alterou o art. 155, § 2º, inciso IX, alínea “a” da CF/1988. Não basta a ocorrência de importação. Faz-se necessário que a importação seja originada de um ato comercial, ou seja, que o bem seja incorporado ao ativo fixo da empresa. A importação de Aeronave por meio do sistema de leasing de natureza operacional, não está sujeita à incidência do ICMS.
Recurso improvido e reexame necessário desacolhido.
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