Juízo de Admissibilidade e Limites à “Objetivação” do Recurso Extraordinário. RE 582.760. Julgamentos do STF em Vídeo. Sessão de 05/11/08.

No julgamento do RE 582.760, cujo vídeo disponibiliza-se abaixo, colocou-se o STF a questão relativa ao alcance da denominada tendência de “objetivação” do recurso extraordinário.

 

A corrente minoritária, composta pelos eminentes Ministros Gilmar Mendes e Cármen Lúcia, assentou ser possível ao Tribunal declarar a (in)constitucionalidade de norma (discutida também na ADIn 2316) ainda quando não suscetível de conhecimento o recurso (na espécie,  por assentar-se o acórdão recorrido em fundamento decorrente da interpretação: (a) de norma infraconstitucional e; (b) de cláusula contratual). Sufragou, porém, a maioria, a tese de que somente se positivo o juízo de admissibilidade da insurgência poderia o Pretório cogitar a hipótese de decidir sobre a constitucionalidade do preceito.

 

Dentre os diversos fundamentos expendidos pela minoria, aponta-se o de que a repercussão geral teria ampliado (ou, se se preferir, confirmado) a dimensão objetiva do recurso ao ponto de permitir a incursão do Tribunal pelo tema da constitucionalidade, ainda quando ele não interesse aos litigantes no caso concreto. Assinalou o Ministro Gilmar Mendes, para atestar o ponto, a possibilidade da manifestação de terceiros, ao que a Eminente Relatora Cármen Lúcia registrou haver, no próprio feito em julgamento, recebido diversos memoriais de estranhos ao litígio, mas interessados em seu desfecho.

 

Créditos: TV Justiça

(Obs. Estão marcados com círculos na barra de navegação do vídeo os pontos do julgamento versados no presente texto. Clicar sobre eles provocará a exibição do trecho correspondente. É possível, ainda, ao leitor, adicionar comentários a qualquer instante, bastando, para isso, após pausar o vídeo no momento desejado, clicar-se sobre o cursor e, em seguida, no botão “+” que será mostrado.)

 

Sobre o tema da possibilidade de superação de requisitos de admissibilidade do recurso por força da relevância da questão nele veiculada, registra-se o adminículo colhido do direito comparado por Arruda Alvim:

 

Reforma do Judiciário

“Na doutrina argentina, sucessiva à instituição da gravidade institucional, vai-se mais longe, pois aí se afirma que a gravidade institucional ‘(…) puede ser invocada para remover obstáculos en el aceso a la Corte [o que, no Brasil, parece ser inviável ou mais difícil, pois o autor citado quis significar transigência com as hipóteses de cabimento, propriamente dito, do recurso extraordinário (…)”. O que sustenta repetitivamente mesmo é que ‘la gravedad institucional puede suplir también la falta de requisitos de admissibilidad’, o que não ocorreu no Brasil durante a existência da arguição de relevância.”

A E.C N.45 e o Instituto da Repercussão Geral, in Reforma do Judiciário, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, Luiz Rodrigues Wambier, Luiz Manoel Gomes Jr, Octavio Campos Fisher e William Santos Ferreira, RT, 2005.

 

 

A respeito da “Objetivação do Recurso Extraordinário”, colhe-se de Fredie Didier Jr:

Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis - vol. 10

 

Um dos aspectos dessa mudança é a transformação do recurso extraordinário, que, embora instrumento do controle difuso de constitucionalidade das leis, tem servido, também, ao controle abstrato.

(…)

O STF, ao examinar a constitucionalidade de uma lei em recurso extraordinário, tem seguido esta linha. A decisão sobre a questão da inconstitucionalidade seria tomada em abstrato, passando a orientar o tribunal em situações semelhantes.

(…)

Tudo isso nos leva a admitir a ampliação do cabimento da reclamação constitucional, para abranger os casos de desobediência a decisões tomadas pelo Pleno do STF em controle difuso de constitucionalidade, independentemente da existência de enunciado sumular de eficácia vinculante.

Transformações do Recurso Extraordinário, in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e Assuntos Afins, vol. 10, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Jr, RT, 2006. (O trabalho faz ampla remissão a precedentes do STF).

 

Além da possibilidade do exercício do controle de constitucionalidade em recurso inadmissível, abordou o eminente Ministro Gilmar Mendes o tema da “causa de pedir” aberta do RE.

 

 

Acórdão Recorrido

 

Ementa:

 

APELAÇÃO CÍVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE.

Cabível a revisão dos contratos como forma de expunção das disposições contrárias à lei. As atividades bancária e financeira estão sujeitas às regras do Código de Defesa do Consumidor, como expresso no art. 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90.

 

NULIDADE DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. POSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DE OFÍCIO.

Por serem de ordem pública e interesse social as normas de proteção e defesa do consumidor, possível a declaração de ofício da nulidade das cláusulas eivadas de abusividade.

 

JUROS REMUNERATÓRIOS. DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.

É de ser declarada a nulidade da previsão contratual acerca dos juros, por caracterizar a excessiva onerosidade do contrato, permitindo que o consumidor ocupe posição nítida e exageradamente desvantajosa. Índice reduzido para 12% ao ano, por incidência da regra geral advinda da combinação dos artigos 591 e 406 do Código Civil vigente, e 161, § 1º, do Código Tributário Nacional.

Esta Câmara não entende cabível a adoção da taxa SELIC, pois, além de não prevista legal ou contratualmente, embute a atualização futura da moeda e sua fixação varia ao sabor do mercado, o que implica abusividade.

 

ÍNDICE DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.

Reduzidos os juros remuneratórios e ausente qualquer fator de atualização monetária no contrato sub iudice, adota-se o IGP-M, por melhor refletir a desvalorização da moeda.

 

CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.

A capitalização mensal dos juros, mesmo quando expressamente convencionada, em contratos como o presente, não é admitida, porquanto o artigo 591 do atual Código Civil permite, como regra geral, apenas a capitalização anual dos juros. Mas, em se tratando de mera permissão legal, a capitalização anual depende de pactuação nesse sentido, ausente na espécie, motivo pelo qual, in casu, vai vedada a incidência de juros sobre juros em qualquer periodicidade.

 

COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.

A sentença afastou a comissão de permanência e não há recurso específico da instituição financeira quanto ao ponto, motivo pelo qual vai mantido o decisum, até porque em consonância ao entendimento deste Órgão Fracionário.

 

JUROS MORATÓRIOS.

Os juros moratórios devem respeitar o percentual máximo de 1% ao mês, consoante disposição do artigo 406 no Código Civil Brasileiro, o qual incide sobre o pacto avençado, considerando a data da contratação.

 

MULTA MORATÓRIA. DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.

Se incorrer em mora o devedor, a multa deve ficar limitada a 2% do valor da(s) parcela(s) efetivamente em atraso, por firmado o contrato após a vigência da Lei nº 9298/96.

 

COMISSÃO DE OPERAÇÕES ATIVAS. AFASTAMENTO DE OFÍCIO.

A cobrança de tal tarifa é nitidamente abusiva, devendo ser suportada pela instituição financeira, por corresponder a ônus da sua atividade econômica, não se tratando de serviço prestado em prol do mutuário-consumidor.

 

MORA DESCARACTERIZADA.

Sendo expurgados encargos indevidos da dívida, o mutuário não estava em mora e os encargos moratórios, por isso, não são devidos.

 

COMPENSAÇÃO E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.

Diante das ilegalidades na estipulação dos encargos contratuais, não há falar em voluntariedade no pagamento, nem exigir a prova do erro para a repetição do indébito, que se dará mediante prévia compensação.

 

PROIBIÇÃO DE INSCRIÇÃO DO NOME DO DEVEDOR EM ÓRGÃOS DE RESTRIÇÃO AO CRÉDITO.

Encontrando-se sub judice a relação contratual, por ocasião de ação de revisão de contrato, é cabível a proibição de inscrição do nome da apelante em cadastros de inadimplentes. Conclusão nº 11 do CETJRS.

 

SUCUMBÊNCIA. Redefinida.

 

APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA, COM DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO.

 

 

Excertos do voto da relatora da decisão recorrida, citados pela eminente Ministra Cármen Lúcia:

 

A capitalização mensal dos juros, mesmo quando expressamente convencionada, em contratos como o presente, não é admitida, porquanto o artigo 591 do atual Código Civil permite, como regra geral, apenas a capitalização anual dos juros, amoldando-se à autorização já existente aos contratos de abertura de crédito rotativo em conta corrente, sem prejuízo do disposto nos Decretos-Lei ns. 167/67 e 413/69, que admitem a capitalização semestral para os casos de débito originado em cédulas de crédito industrial, comercial e rural. Mas, em se tratando de mera permissão legal, a capitalização anual depende de pactuação expressa nesse sentido, ausente na espécie, motivo pelo qual, in casu, vai vedada a incidência de juros sobre juros em qualquer periodicidade.

 

Tal entendimento, a propósito, não colide com o artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170/2001, que republicou a Medida Provisória nº 1.963, que não pode ser aplicada. É que a matéria ali versada não se reveste do caráter de relevância e urgência determinado pelo art.62 da Constituição Federal. Tratando-se deste tema, portanto, necessário que passe pelo processo legislativo ordinário. Neste sentido é a AC.70008648784, de 19/05/2004, Relator o Desembargador Paulo Augusto Monte Lopes, da 16ª Câmara Cível deste Tribunal, cuja ementa transcrevo parcialmente:

“A Medida Provisória nº 2.170-36 é inconstitucional, porque a capitalização dos juros não se enquadra naquelas matérias consideradas urgentes, exigência prevista no art.62 da CF/ 88.”

 

Ainda transcrevo, por pertinente, a seguinte jurisprudência deste tribunal, AC 70008879900, de 31/05/2004, Relator o Desembargador Mário Rocha Lopes Filho, da 8ª Câmara Cível , transcrição parcial:

“CAPITALIZAÇÃO. Inadmissível a capitalização mensal, por ausência de previsão legal. (...) É de se afastar a aplicabilidade do art.5º da Medida Provisória, pois o STF já se pronunciou, em julgamento de liminar ainda não encerrado, favorável à suspensão da sua vigência (ADIN nº 2.316 – DF)”

Acrescento, ainda, que a Corte Especial do egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em 02.08.2004, nos autos do Incidente de inconstitucionalidade nº 2001.71.00.004856-0/RS, manifestou-se pela inconstitucionalidade do artigo 5º da Medida Provisória 2.170, porquanto, justamente, destituída dos requisitos de relevância e urgência previstos no artigo 62 da Constituição Federal. É o que se depreende da respectiva ementa:

“INCIDENTE DE ARGÜIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE CRÉDITO ROTATIVO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. SUSCITADA A INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MP Nº 2.170, DE 23/08/2001, PERANTE A CORTE ESPECIAL.

1. Até o advento da indigitada MP nº 1.963-17, publicada em 31/03/2000 (MP nº 2.170, de 23/08/2001 -última edição), a capitalização dos juros mês a mês, nos contratos de abertura de crédito rotativo em conta-corrente - cheque especial - e nos contratos de renegociação, à mingua de legislação especial que a autorizasse, estava expressamente vedada. 2. Estavam excluídos da proibição os contratos previsto no Decreto-lei nº 167, de 14/02/67, no Decreto-lei 413, de 09/01/69 e na Lei 6.840, de 03/11/80, que dispõe sobre títulos de crédito rural, título de crédito industrial e títulos de crédito comercial, respectivamente. 3. O Executivo, extrapolando o permissivo constitucional, tratou de matéria antiga, onde evidentemente não havia pressa alguma, eis que a capitalização de juros é matéria que remonta à época do Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura). A gravidade é ainda maior quando se tem em conta que a capitalização de juros em contratos bancários e financeiros tem implicações numa significativa gama de relações jurídicas. 4. Não verificado o requisito ´urgência´ no que se refere à regulamentação da capitalização dos juros em período inferior a um ano. Especialmente quando se trata de uma MP que, dispondo sobre a administração dos recursos de caixa do Tesouro Nacional, dá providências sobre a capitalização de juros para as instituições financeiras. 5. Não se pode reputar urgente uma disposição que trate de matéria há muito discutida, e que, ardilosamente foi enxertada na Medida Provisória, já que trata de tema totalmente diverso do seu conteúdo. Além disto, estatui preceito discriminatório, porque restringe a capitalização de juros questionada unicamente às instituições financeiras. A urgência, portanto, só se verifica para os próprios beneficiados pela regra, já que, para todos os demais, representa verdadeiro descompasso entre a prestação e a contra-prestação, além de onerar um contrato que por natureza desiguala os contratantes (de adesão). Declarada a inconstitucionalidade por maioria” (Inc.Arg. Inconst. AC nº 2001.71.00.004856-0/RS. Corte Especial. Relator: Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon; julgado em 02/08/2004; DJU em 08/09/2004; publicado na Revista do TRF da 4ª Região, Porto Alegre, a. 16, nº 55, p. 475-485).

 

Não se desconhece, também, o disposto na Emenda Constitucional n. 32, mas se entende que seus termos não têm o condão de alterar os fundamentos ora expostos.

 

Ademais, a atual jurisprudência do STJ vem admitindo a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual, com base no art. 5° da Medida Provisória n. 2.170-36/01, mas somente se assim tiver sido expressamente pactuado, como exemplifica o seguinte precedente:

“PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - AGRAVO REGIMENTAL – CONTRATO BANCÁRIO - FINANCIAMENTO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – JUROS REMUNERATÓRIOS - COMPENSAÇÃO DE VALORES - DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO - SÚMULA 284/STF - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS - PACTUAÇÃO - COMPROVAÇÃO - SÚMULA 7/STJ - DESPROVIMENTO.

1 - Com relação à limitação dos juros remuneratórios, à comissão de permanência e à compensação, a decisão ora atacada ressaltou a deficiência na fundamentação, porquanto o recorrente não indicou qualquer dispositivo legal tido por violado. Aplicável, portanto, a Súmula 284/STJ. Precedentes.

2 - Este Tribunal já proclamou o entendimento no sentido de que, nos contratos firmados posteriormente à edição da MP 1.963-17/2000, de 31 de março de 2000 (atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2001), admite-se a capitalização mensal dos juros, desde que expressamente pactuada. In casu, não restou comprovada a pactuação da capitalização mensal nos autos, nas instâncias ordinárias, de forma que correto o afastamento de sua cobrança. Ademais, no que pertine à prova de previsão contratual, esta Corte entende que a discussão acerca da existência de tal encargo exige o reexame do conjunto fático-probatório, absolutamente vedado nesta seara, a teor da Súmula nº 07/STJ.

3 - Agravo regimental desprovido” (AgRg no REsp 741906, Ministro JORGE SCARTEZZINI, T4 - QUARTA TURMA, 03/11/2005, DJ 21.11.2005 p. 257).

 

Na espécie, entretanto, como já se disse, sequer se verifica no pacto a existência de cláusula contratual informando ao consumidor a incidência de capitalização de juros no ajuste, tampouco a sua periodicidade, se diária, mensal, semestral ou anual, em manifesta violação aos princípios da boa-fé objetiva, da transparência nas relações negociais e ao direito do consumidor de receber informações adequadas e precisas a respeito das obrigações que lhe são impostas. Conseqüentemente, ausente pacto expresso da capitalização dos juros, isso corrobora a proibição da prática.

 

Portanto, pelos fundamentos supra, que se sobrepõem ao disposto tanto nas Medidas Provisórias quanto na Emenda Constitucional antes referidas, bem como ao disposto no artigo 591 do atual CCB, é vedada a capitalização na espécie, mesmo em periodicidade anual, porquanto ausente pacto nesse sentido.

 

In casu, embora a parte apelante pugne apenas pelo afastamento da capitalização mensal dos juros, o anatocismo é de ser totalmente afastado, de ofício, porquanto ausente pacto autorizando a capitalização anual ou mesmo mensal.

 

 

Questão Posta no Recurso Extraordinário

 

A da constitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 2.170-36/2001, segundo o qual:

 

“Art. 5º. Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.

 

Parágrafo único. Sempre que necessário ou quando solicitado pelo devedor, a apuração do valor exato da obrigação, ou de seu saldo devedor, será feita pelo credor por meio de planilha de cálculo que evidencie de modo claro, preciso e de fácil entendimento e compreensão, o valor principal da dívida, seus encargos e despesas contratuais, a parcela de juros e os critérios de sua incidência, a parcela correspondente a multas e demais penalidades contratuais.”

 

Do relatório da eminente Ministra Cármen Lúcia, colhe-se haver alegado o recorrente:

 

“Ainda que se possa admitir a análise dos requisitos de urgência e relevância ao caso sub-judice, da Medida Provisória 2170, vale sobrelevar que a capitalização composta de juros mensalmente é prática usual do mercado financeiro e representa fator substancial da redução nas taxas nominais de juros, sobretudo em um sistema como o nosso, em que as taxas são livres e fixadas pelo próprio mercado. Assim, a vedação à capitalização de juros sobre juros poderia até mesmo prejudicar a necessária transparência que deve haver nos contratos financeiros, por acabar reforçando as instituições financeiras a embutir nas taxas nominais de juros um adicional equivalente à capitalização, já que todos os investimentos que remuneram são capitalizados mensalmente.

 

Melhor esclarecendo, os bancos e outras instituições pagam juros compostos na captação de artigos financeiros, e portanto a vedação da capitalização acabaria por equacionar possíveis prejuízos visando a uma compensação. Diante disso, não se afigura plausível que a permissão prevista na medida provisória seja simplesmente tida como inconstitucional, pois visa à preservação da boa-fé objetiva nas relações contratuais e evita perdas por parte do sistema financeiro e majoração das taxas de juros, o que não se coaduna com a alegada inexistência de urgência e relevância.

 

Na própria exposição de motivos da medida provisória, o então Ministro da Fazenda lembrou a necessidade de adequação das taxas primárias, e aquelas cobradas dos tomadores de financiamentos, e naquele momento concluiu também o ex-ministro que mantida a disciplina do decreto 22.626, o devedor pontual em seus pagamentos está pela via reflexa financiando aqueles que deixam de honrar seus compromissos.

 

A vedação à cobrança de juros sobre juros portanto não reduziria os encargos para os mutuários, influindo diretamente no aumento das taxas para todos os devedores. Mantida a vedação da capitalização de juros em período inferior ao anual, os devedores de grandes quantias seriam, estes sim, beneficiados em detrimento dos pequenos mutuários, vez que o risco de crédito seria repassado a todos os tomadores de recursos.

 

 

Excerto do voto ministra Cármen Lúcia sobre a questão da constitucionalidade da Medida Provisória:

 

Eminente Ministra Cármen Lúcia

“Segundo concluí, a mera permissão legal de se utilizar a capitalização mensal de juros não me parece eivar de inconstitucional o art. 5º da medida provisória 2170-36 de 2001. A inconstitucionalidade eventualmente ocorrerá no contrato a partir da análise dos casos concretos, nos quais se examinará a presença de informações precisas e claras sobre a taxa real de juros que o consumidor pagará ao final do contrato”.

 

 

 

 

 

 

Excertos dos Debates sobre a possibilidade de declaração da constitucionalidade da norma, a despeito da inadmissibilidade do Recurso.

 

Eminente Ministro Marco Aurélio:

 

Ministro Marco Aurélio.

“Nós estamos funcionando praticamente como órgão consultivo. O que nós temos que perceber é o objeto do recurso extraordinário e o fundamento do acórdão impugnado. O fundamento é estritamente legal [i.e, infraconstitucional], como ressaltado pela procuradoria geral da república, e o especial junto ao Superior Tribunal de Justiça foi conhecido e provido em parte. Ou seja, nesse acórdão nós não temos como base da decisão proferida a declaração de inconstitucionalidade de qualquer dispositivo normativo.”

 

(Resultado do julgamento do Especial, aludido pelo Ministro Marco Aurélio:

Recurso Especial 1023372

 

No que tange à capitalização mensal de juros, o entendimento prevalecente nesta Corte era no sentido de que esta somente seria admitida em casos específicos, previstos em lei (cédulas de crédito rural, comercial e industrial), conforme a Súmula n° 93/STJ. Com a edição da MP 1.963-17, de 30.03.2000 (atualmente reeditada sob o nº 2.170-36/2000), passou-se a admitir a capitalização mensal nos contratos firmados posteriormente à sua entrada em vigor, desde que houvesse previsão contratual.

 

Verifica-se, in casu, que o aresto recorrido afirmou que o contrato em discussão não prevê expressamente a possibilidade de capitalização de juros, razão pela qual deve ser mantida a proibição. Saliente-se, outrossim, que a revisão desta conclusão do acórdão impugnado demandaria o reexame de matéria fática e a interpretação de cláusulas contratuais, providências vedadas em sede de recurso especial, a teor dos enunciados 5 e 7/STJ. )

 

 

STF. Ministro Marco Aurélio

Não estamos aqui a julgar processo objetivo. Estamos a julgar um processo subjetivo que possui balizas próprias, balizas subjetivas e balizas que dizem respeito ao conflito de interesses. Não foi apregoada a Adin, a Adin mencionada, e aguardaremos o relato pelo Ministro César Peluso para nos pronunciar sobre a harmonia ou não da medida provisória envolvida na Adin com a Constituição Federal.”

 

“Há de se distinguir, Presidente, recorribilidade ordinária da recorribilidade extraordinária, sob pena de transformar-se o Supremo e os demais Tribunais Superiores em órgãos revisores de todos os demais Tribunais do País. Se, de um lado, quanto à apelação, que é o recurso por excelência, nós temos a mitigação dos embargos declaratórios; nós temos, ante o disposto no art. 515 do Código de Processo Civil uma devolução plena, que implica, sem a menor sombra de dúvidas, supressão de instância - porque o 515 contempla inclusive aquele caso de extinção do processo na origem, no juízo, sem julgamento de mérito e possibilidade de no julgamento da apelação, sendo a matéria estritamente de direito, o Tribunal pronunciar-se sobre conflito de interesses ainda não julgado pelo juízo -, não podemos transportar essa regra, que é uma regra que se situa no campo da exceção, e só pode ser interpretada de forma estrita, para o campo extraordinário.

 

Reafirmo – e numa profissão de fé quanto ao direito instrumental – que em sede extraordinária não se julga tema pela vez primeira. E não se julga por um motivo muito simples: é que o recorrente, além de estar compelido a atender cumulativamente os pressupostos gerais de recorribilidade, deve atender a pelo menos um dos específicos – e no caso do extraordinário eles estão no inciso III do inciso 102 –, e para fazê-lo ele suscita nas razões recursais o cotejo, e evidentemente não se pode cotejar o inexistente – porque não houve pronunciamento considerado o acórdão impugnado mediante extraordinário – com o existente. O debate e a decisão prévios, que merecem o rótulo de prequestionamento, visam justamente o cotejo.

 

O que houve na espécie: a Corte de origem decidiu quanto à capitalização dos juros, a favor, sim, não do banco, a favor do consumidor, considerada cláusula contratual, e consideradas normas estritamente legais. Podemos abandonar esses parâmetros? A meu ver não, e a tanto não leva um instituto que hoje é próprio ao recurso extraordinário stricto sensu que é a repercussão geral. Não é a circunstância de admitir-se terceiros no processo que conduzirá a Corte a julgar um tema pela vez primeira. Estará ela sempre e sempre jungida, no âmbito do extraordinário, ao que decidido pela Corte de origem. O terceiro, ele participa de um processo já definido. Ele não pode vir, por exemplo, e articular uma causa de pedir estranha à causa de pedir apontada pela própria parte nas razões do recurso, ou apontada pela parte mas no vazio, sem que tenha sido realmente empolgada na oportunidade própria, ou seja, na derradeira instância ordinária. Eu penso que, a não ser assim Presidente, ao invés de a repercussão geral implicar a racionalização dos trabalhos da Corte, implicará isto sim a Babel”.

 

 

Eminente Ministro Gilmar Mendes:

STF. Ministro Gilmar Mendes.

“Eu tenho a impressão de que nós temos uma perspectiva aqui de que o RE, na verdade, ganha uma dimensão objetiva. Esse debate está posto. Nós temos falado da causa petendi aberta. Ora, nesse contexto, podemos nos pronunciar, sim, sobre a questão da constitucionalidade que é objeto do debate.”

 

A jurisprudência do Tribunal em matéria de constitucionalidade, tanto quanto eu me lembre, é de que é possível, sim, se pronunciar até sobre objeto estranho à questão, desde que o debate se acenda.

 

“(…) o Tribunal não se tem atido mais – e aí, diria eu, felizmente – àquela ortodoxia do recurso extraordinário apenas como matéria de caráter subjetivo, ou como elemento de defesa de caráter subjetivo. Pelo contrário, a partir de várias decisões nós termos tido a manifestação do Tribunal no sentido de – especialmente quando se trata da inconstitucionalidade ou da constitucionalidade – o Tribunal se manifestar a despeito de aquela manifestação não aproveitar o caso concreto.”

 

Precedentes citados pelo eminente Ministro Gilmar Mendes:

 

 

Mandado de Segurança. Município de interesse da segurança nacional e descaracterizado, como tal, pelo Decreto-lei n. 2.183/1984. Ato do Presidente da Republica designando Prefeito "pro tempore". Mandado de segurança impetrado pelo Prefeito, que vinha provendo o cargo, para prosseguir no exercício das funções, pleiteando somente ser exonerado por ato do Governador do Estado. Liminar concedida. Arguida "incidenter" tantum" a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, que se deva aplicar no julgamento da causa, o Plenário do STF não pode furtar-se ao exame preliminar dessa argüição, de acordo com os arts. 176 e 177, do Regimento Interno. Autonomia municipal. Emenda Constitucional n. 1, de 1969, art. 15, I, e paragrafo 1., letra "b". Emenda Constitucional n. 25, de 1985, art. 2. e paragrafo 3.. Inconciliavel com o sistema das regras constitucionais aludidas a designação de Prefeito "pro tempore", pelo Presidente da Republica, nos municípios descaracterizados como de segurança nacional. Inconstitucionalidade do paragrafo 2. do art. 1., do Decreto-lei n. 1866, de 09 de marco de 1981, bem como do "caput" do art. 1. e de seu paragrafo 2., e do art. 2., ambos do Decreto n. 85.952, de 29 de abril de 1981. Mandado de segurança concedido, confirmando-se a medida liminar.

 

(Obs. Na espécie, entendera o relator que o exame do ato à luz da norma infraconstitucional bastava a fundamentar decisão favorável ao recorrente, sendo despicienda a análise da constitucionalidade da lei [vide fls. 73-74]. Todavia, sagrou-se vencedora a tese de que, suscitada a inconstitucionalidade do preceito, tal questão seria prejudicial, impondo-se à Casa apreciá-la.)

 

 

IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS. DISCRIMINAÇÃO DE ALIQUOTAS. RESOLUÇÃO N.7, DE 22 DE ABRIL DE 1980, DO SENADO FEDERAL. INCONSTITUCIONALIDADE (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 23, PARAGRAFO 5. (REDAÇÃO ANTERIOR A E.C. 23/83). DIVERGENCIA DA SÚMULA 569. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO, MAS NÃO PROVIDO.

 

Do voto do eminente Ministro Oscar Corrêa, colhe-se:

Eminente Ministro Oscar Corrêa

 

(…) ainda que não aproveitando à recorrente a declaração da inconstitucionalidade da Res. 07/80 – que, aliás, não pleiteou – conheço do recurso – em face da divergência com a Súmula 569 e da frontal ofensa ao §5º do art. 23 da C.F (redação anterior à EC 23/83) e lhe dou provimento para declarar a inconstitucionalidade da Res. 07/80, de 22/04/1980, do Senado Federal.

 

 

 

 

 

Do Voto do Eminente Ministro Néri da Silveira, extrai-se:

 

Eminente Ministro Néri da Silveira 

É de reconhecer-se, em decorrência, a inconstitucionalidade da resolução nº 7/1980, do Senado Federal. Dir-se-á que a declaração em referência em nada beneficiaria a recorrente. É exato que, proclamada incidenter tantum, não terá como resultado prosperar o apelo extremo da recorrente. Tal, entretanto, não basta a inviabilizar a solução a que chego.

 

Com efeito, o recurso extraordinário da impetrante é de conhecer-se, porque o acórdão está em divergência com a Súmula 569, que é, também invocada como fundamento do apelo extremo. Conhecido o recurso pela letra “d”, do permissivo constitucional, não é, entretanto, de prover-se. Com efeito, a Resolução nº 7/1980, porque inconstitucional, não pode beneficiar a impetrante, nos termos pretendidos, qual seja, o cálculo da alíquota, à base de 11%, como nela se prevê, a partir do princípio da isonomia. O voto do Senhor Ministro Cordeiro Guerra conhece do recurso e lhe dá provimento para conceder a segurança, declarando a inconstitucionalidade das expressões - ‘que destinem mercadorias a contribuintes para fins de industrialização e comercialização’ – do art. 1º da Resolução nº 7, de 22 de abril de 1980, do inciso III, que foi acrescentado ao art. 1º da Resolução nº 129, de 28 de novembro de 1979.” Entendo, entretanto, que a inconstitucionalidade fere a Resolução nº 7/1980, em sua integralidade, e não apenas a cláusula aludida, pressuposto de sua edição, nenhum assento normativo subsiste a amparar a pretensão da impetrante.

 

Do exposto, conheço do recurso, por dissídio com a Súmula 569, mas lhe nego provimento, declarando a inconstitucionalidade da Resolução nº 7, de 1980, do Senado Federal.

 

Do voto do Ministro Rafael Mayer, colhe-se:

 

Eminente Ministro Rafael Mayer

“Entendo que esse aspecto da inconstitucionalidade é enquadrável na hipótese do recurso, porque, conhecido, julga-se a causa, e, posta uma questão prejudicial de inconstitucionalidade, ela é neutra – não favorece nem beneficia.

 

A teoria da inconstitucionalidade incidente é pelo princípio de que o juiz não está obrigado, pelo contrário, a aplicar uma lei que considere inconstitucional.

 

Conhecendo a causa, o que se dá, na espécie, se se nega provimento? Indefere-se o mandado de segurança. Dá-se, portanto, uma solução à espécie em concreto a partir da inconstitucionalidade da lei em que se apóia o pedido.”

 

 

 

 

O eminente Ministro Francisco Rezek, que votara pelo não conhecimento do recurso, averbou ao ter de decidir o tema da inconstitucionalidade:

 

Eminente Ministro Francisco Rezek

'”(…) vejo-me posto diante da questão constitucional em plano abstrato, com a incômoda impressão de estar cuidando de uma representação por inconstitucionalidade, em tese, dentro do recurso extraordinário em mandado de segurança”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(…)2. Laudo arbitral: homologação: Lei da Arbitragem: controle incidental de constitucionalidade e o papel do STF. A constitucionalidade da primeira das inovações da Lei da Arbitragem - a possibilidade de execução específica de compromisso arbitral - não constitui, na espécie, questão prejudicial da homologação do laudo estrangeiro; a essa interessa apenas, como premissa, a extinção, no direito interno, da homologação judicial do laudo (arts. 18 e 31), e sua conseqüente dispensa, na origem, como requisito de reconhecimento, no Brasil, de sentença arbitral estrangeira (art. 35). A completa assimilação, no direito interno, da decisão arbitral à decisão judicial, pela nova Lei de Arbitragem, já bastaria, a rigor, para autorizar a homologação, no Brasil, do laudo arbitral estrangeiro, independentemente de sua prévia homologação pela Justiça do país de origem. Ainda que não seja essencial à solução do caso concreto, não pode o Tribunal - dado o seu papel de "guarda da Constituição" - se furtar a enfrentar o problema de constitucionalidade suscitado incidentemente (v.g. MS 20.505, Néri). 3. Lei de Arbitragem (L. 9.307/96): constitucionalidade, em tese, do juízo arbitral; discussão incidental da constitucionalidade de vários dos tópicos da nova lei, especialmente acerca da compatibilidade, ou não, entre a execução judicial específica para a solução de futuros conflitos da cláusula compromissória e a garantia constitucional da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário (CF, art. 5º, XXXV). Constitucionalidade declarada pelo plenário, considerando o Tribunal, por maioria de votos, que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória, quando da celebração do contrato, e a permissão legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o compromisso não ofendem o artigo 5º, XXXV, da CF. Votos vencidos, em parte - incluído o do relator - que entendiam inconstitucionais a cláusula compromissória - dada a indeterminação de seu objeto - e a possibilidade de a outra parte, havendo resistência quanto à instituição da arbitragem, recorrer ao Poder Judiciário para compelir a parte recalcitrante a firmar o compromisso, e, conseqüentemente, declaravam a inconstitucionalidade de dispositivos da Lei 9.307/96 (art. 6º, parág. único; 7º e seus parágrafos e, no art. 41, das novas redações atribuídas ao art. 267, VII e art. 301, inciso IX do C. Pr. Civil; e art. 42), por violação da garantia da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário. Constitucionalidade - aí por decisão unânime, dos dispositivos da Lei de Arbitragem que prescrevem a irrecorribilidade (art. 18) e os efeitos de decisão judiciária da sentença arbitral (art. 31).

 

 

EMENTA: AÇÃO ORIGINÁRIA. MANDADO DE SEGURANÇA. MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR. INEXISTÊNCIA DE DIREITO A AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. COMPETÊNCIA DO STF. DECISÃO ADMINISTRATIVA QUE A CONCEDE A JUÍZES AUDITORES DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Competência do Supremo Tribunal Federal. Inteligência do artigo 102, inciso I, alínea n, parte final, da Constituição Federal. 2. Não-aplicação do artigo 22 da Lei 8460/92, com a redação dada pela Medida Provisória 1522/96, aos membros do Poder Judiciário, que são regidos pela LOMAN. 3. A expressão "adicionais ou vantagens pecuniárias", objeto da vedação do artigo 65, § 2º, da LC 35/79, deve entender-se como todo e qualquer acréscimo pago ao magistrado, seja de que natureza for, inclusive indenizatória. Precedentes. 4. Declarada, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do Ato 274, de 16 de abril de 1997, do Conselho de Administração do Superior Tribunal Militar, que concedeu o auxílio-alimentação aos Juízes Auditores da Justiça Militar da União.

Sobre a Causa de Pedir Aberta

 

EMENTA: I. Recurso extraordinário: letra a: possibilidade de confirmação da decisão recorrida por fundamento constitucional diverso daquele em que se alicerçou o acórdão recorrido e em cuja inaplicabilidade ao caso se baseia o recurso extraordinário: manutenção, lastreada na garantia da irredutibilidade de vencimentos, da conclusão do acórdão recorrido, não obstante fundamentado este na violação do direito adquirido. II. Recurso extraordinário: letra a: alteração da tradicional orientação jurisprudencial do STF, segundo a qual só se conhece do RE, a, se for para dar-lhe provimento: distinção necessária entre o juízo de admissibilidade do RE, a - para o qual é suficiente que o recorrente alegue adequadamente a contrariedade pelo acórdão recorrido de dispositivos da Constituição nele prequestionados - e o juízo de mérito, que envolve a verificação da compatibilidade ou não entre a decisão recorrida e a Constituição, ainda que sob prisma diverso daquele em que se hajam baseado o Tribunal a quo e o recurso extraordinário. III. Irredutibilidade de vencimentos: garantia constitucional que é modalidade qualificada da proteção ao direito adquirido, na medida em que a sua incidência pressupõe a licitude da aquisição do direito a determinada remuneração. IV. Irredutibilidade de vencimentos: violação por lei cuja aplicação implicaria reduzir vencimentos já reajustados conforme a legislação anterior incidente na data a partir da qual se prescreveu a aplicabilidade retroativa da lei nova.

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - ATO NORMATIVO DECLARADO INCONSTITUCIONAL - LIMITES. Alicerçado o extraordinário na alinea b do inciso III do artigo 102 da Constituição Federal, a atuação do Supremo Tribunal Federal faz-se na extensão do provimento judicial atacado. Os limites da lide não a balizam, no que verificada declaração de inconstitucionalidade que os excederam. Alcance da atividade precipua do Supremo Tribunal Federal - de guarda maior da Carta Política da República. TRIBUTO - RELAÇÃO JURÍDICA ESTADO/CONTRIBUINTE - PEDRA DE TOQUE. No embate diário Estado/contribuinte, a Carta Política da República exsurge com insuplantável valia, no que, em prol do segundo, impõe parâmetros a serem respeitados pelo primeiro. Dentre as garantias constitucionais explícitas, e a constatação não excluí o reconhecimento de outras decorrentes do próprio sistema adotado, exsurge a de que somente a lei complementar cabe "a definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes" - alinea "a" do inciso III do artigo 146 do Diploma Maior de 1988. IMPOSTO DE RENDA - RETENÇÃO NA FONTE - SÓCIO COTISTA. A norma insculpida no artigo 35 da Lei nº 7.713/88 mostra-se harmônica com a Constituição Federal quando o contrato social preve a disponibilidade econômica ou jurídica imediata, pelos sócios, do lucro líquido apurado, na data do encerramento do período-base. Nesse caso, o citado artigo exsurge como explicitação do fato gerador estabelecido no artigo 43 do Código Tributário Nacional, não cabendo dizer da disciplina, de tal elemento do tributo, via legislação ordinária. Interpretação da norma conforme o Texto Maior. IMPOSTO DE RENDA - RETENÇÃO NA FONTE - ACIONISTA. O artigo 35 da Lei nº 7.713/88 e inconstitucional, ao revelar como fato gerador do imposto de renda na modalidade "desconto na fonte", relativamente aos acionistas, a simples apuração, pela sociedade e na data do encerramento do período-base, do lucro líquido, já que o fenômeno não implica qualquer das espécies de disponibilidade versadas no artigo 43 do Código Tributário Nacional, isto diante da Lei nº 6.404/76. IMPOSTO DE RENDA - RETENÇÃO NA FONTE - TITULAR DE EMPRESA INDIVIDUAL. O artigo 35 da Lei nº 7.713/88 encerra explicitação do fato gerador, alusivo ao imposto de renda, fixado no artigo 43 do Código Tributário Nacional, mostrando-se harmônico, no particular, com a Constituição Federal. Apurado o lucro líquido da empresa, a destinação fica ao sabor de manifestação de vontade única, ou seja, do titular, fato a demonstrar a disponibilidade jurídica. Situação fática a conduzir a pertinência do princípio da despersonalização. RECURSO EXTRAORDINÁRIO - CONHECIMENTO - JULGAMENTO DA CAUSA. A observância da jurisprudência sedimentada no sentido de que o Supremo Tribunal Federal, conhecendo do recurso extraordinário, julgara a causa aplicando o direito a espécie (verbete nº 456 da Súmula), pressupõe decisão formalizada, a respeito, na instância de origem. Declarada a inconstitucionalidade linear de um certo artigo, uma vez restringida a pecha a uma das normas nele insertas ou a um enfoque determinado, impõe-se a baixa dos autos para que, na origem, seja julgada a lide com apreciação das peculiaridades. Inteligência da ordem constitucional, no que homenageante do devido processo legal, avesso, a mais não poder, as solucões que, embora práticas, resultem no desprezo a organicidade do Direito.

 

 

Do voto do eminente Ministro Gilmar Mendes, colhe-se:

 

Assim, a pesar de não se vislumbrar no presente caso a violação ao art. 239 da Constituição [invocado pelo recorrente nas razões do R.E], diante dos diversos aspectos envolvidos na questão, é possível que o Tribunal analise a matéria com base em fundamento diverso daquele sustentado.

 

A proposta aqui desenvolvida parece consultar a tendência de não-estrita subjetivação ou de maior objetivação do recurso extraordinário, que deixa de ter caráter marcadamente subjetivo ou de defesa de interesse das partes, para assumir, de forma decisiva, a função de defesa da ordem constitucional objetiva. Esse posicionamento foi adotado pelo Plenário no julgamento do AgRSE 5.206, voto proferido em 09.05.97, quando o Relator Sepúlveda Pertence afirmou:

 

“E a experiência demonstra, a cada dia, que a tendência dominante – especialmente na prática deste Tribunal – é no sentido da crescente contaminação da pureza dos dogmas do controle difuso pelos princípios reitores do método concentrado.

Detentor do monopólio do controle direto e, também, como órgão de cúpula do Judiciário, titular da palavra definitiva sobre a validade das normas no controle incidente, em ambos os papéis, o Supremo Tribunal há de ter em vista o melhor cumprimento da missão precípua de ‘guarda da Constituição’, que a Lei fundamental explicitamente lhe confiou.

Ainda que a controvérsia lhe chegue pelas vias recursais do controle difuso, expurgar da ordem jurídica lei inconstitucional ou consagrar-lhe definitivamente a constitucionalidade contestada são tarefas essenciais da Corte, no interesse maior da efetividade da Constituição, cuja realização não se deve subordinar à estrita necessidade, para o julgamento de uma determinada causa, de solver a questão constitucional nela adequadamente contida.

Afinal, não é novidade dizer – como, a respeito da cassação, Calamandrei observou em páginas definitivas (Casación Civil, trad., EJEA, BsAs, 1959, 12 ss.) – que no recurso extraordinário – via por excelência da solução definitiva das questões incidentes de inconstitucionalidade da lei –, a realização da função jurisdicional, para o Supremo Tribunal, é um meio mais que um fim: no sistema de controle incidenter em especial no recurso extraordinário, o interesse particular dos litigantes, como na cassação, é usado ‘como elemento propulsor posto a serviço de interesse público’, que aqui é a guarda da Constituição, para a qual o Tribunal existe.”

 

Da mesma forma, no julgamento do RE 172.058, na sessão de 30.06.95, quando o Relator Marco Aurélio assentou:

 

‘Esclareço que a razão de ser deste voto abrangente, embora a lide envolva tão-somente a situação jurídica de sociedade por quota de responsabilidade limitada, está na circunstância de a Corte de origem haver declarado a inconstitucionalidade do artigo 35, tantas vezes referido, como um todo, ou seja, no que nele residem três normas diversas sobre a disciplina – é certo, sob a mesma inspiração – do desconto na fonte relativamente ao sócio cotista, ao acionista e ao titular da empresa individual. Assim, os limites da lide não revelam os parâmetros da atuação desta Corte, porque foram excedidos na prolação do acórdão atacado. Cabe, ultrapassada a barreira do conhecimento do extraordinário, avançar, em atuação condizente com a atividade precípua que a Constituição Federal impõe ao Supremo – de Guarda Maior dela própria. Indaga-se: o que ocorrerá a não se entender dessa forma? Limitada a apreciação à parte envolvida na lide – desconto na fonte quanto aos cotistas – permanecerá sem o crivo do Supremo Tribunal Federal o provimento do Tribunal Regional Federal no que declarada, também, a inconstitucionalidade do artigo quanto ao acionista e ao titular da empresa individual. Cumpre, na espécie, construir, atento o plenário ao princípio da razoabilidade.’

 

Observe-se, ainda, a decisão proferida no RE 298.694, na sessão de 06.08.03, quando o Relator Sepúlveda Pertence, na confirmação de seu voto consignou:

 

“Seja como for – no ponto nuclear da dissonância do voto do Ministro Moreira Alves –, ouso manter minha posição de que, mesmo no RE, [interposto com base na alínea] a, ao Supremo Tribunal é dado manter o dispositivo do acórdão recorrido, ainda que por fundamento diverso daquele que o tenha lastreado.”

 

Se não se entender assim, ter-se-á um excessivo formalismo do processo constitucional, com sérios prejuízos para a eficácia de decisões desta Corte, e, por que não dizer para o próprio sistema jurídico, que, dependente da forma aleatória de provocação, produzirá decisões incongruentes, dando ensejo à interminável sequência de demandas a propósito de casos já resolvidos por esta Corte.

 

Eminente Ministro César Peluso:

Eminente Ministro Cesar Peluso

Não tenho dúvidas quanto a isso [á possibilidade de o STF pronunciar-se sobre questão não suscitada pela parte] (…). Desde que essa questão constitua um fundamento da decisão. Seja decisão impugnada no extraordinário, seja da decisão que o Supremo vá tomar. Isso não se verifica na hipótese.

 

Nós estamos avançando por um tema cuja decisão não implica para a solução do caso em nada, porque esse recurso é insuscetível de conhecimento, porque há um acórdão fundado em interpretação de norma infraconstitucional.

 

Resultado do Julgamento:

 

O Tribunal, por maioria, não conheceu do recurso, vencidos parcialmente a Senhora Ministra Cármen Lúcia (Relatora) e o Presidente, Ministro Gilmar Mendes, que declaravam a constitucionalidade do artigo 5º da Medida Provisória nº 2.170-36/2001. Ausente, justificadamente, porque em representação do Tribunal Superior Eleitoral no exterior, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa

 

 

Acórdão

 

  • Publicado, em 13/03/09, o acórdão referente ao julgamento ora reproduzido em vídeo, que ficou assim ementado:

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. INTERPRETAÇÃO DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS. DESNECESSIDADE DE EXAME DA CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.170/2001. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.

 

1. Dispensado o exame incidental da constitucionalidade do art. 5º da Medida Provisória n. 2.170/2001 por existir óbice ao conhecimento do recurso extraordinário.

 

2. Assentado no acórdão recorrido a exigência infraconstitucional de que o contrato tenha previsão expressa sobre a capitalização mensal de juros, não se conhece do recurso extraordinário por ausência de utilidade para o Recorrente, pois independentemente da declaração de constitucionalidade da lei o resultado da ação seria o mesmo.

 

3. Recurso extraordinário não conhecido.

 

 

Créditos Imagens Eminente Ministros

Marco Aurélio 1: Gil Ferreira/SCO/STF

Marco Aurélio 2: Gervársio Baptista/SCO/STF

Gilmar Mendes: Gil Ferreira/SCO/STF

Cármen Lúcia: U.Dettmar/SCO/STF

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Direito Integral: Juízo de Admissibilidade e Limites à “Objetivação” do Recurso Extraordinário. RE 582.760. Julgamentos do STF em Vídeo. Sessão de 05/11/08.
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