Noticiou o professor Gilberto Gomes Bruschi a existência de importante acórdão do Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro, proferido em sede de uniformização de jurisprudência (art. 476,II do CPC), assentando:
- A necessidade de intimação pessoal do executado para que se inicie o prazo de 15 dias estabelecido no art. 475-J do CPC para o pagamento da dívida sem a aplicação da multa de 10% (dez por cento).
- A incidência do referido dispositivo, e por conseguinte da mencionada penalidade, nas execuções provisórias.
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ÓRGÃO ESPECIAL
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº. 07/2007
CLASSE REGIMENTAL: 01.
RELATOR DESIGNADO DESEMBARGADOR MARCUS FAVER.
REQUERENTE EGRÉGIA 6ª CÂMARA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INTERESSADO 1 TELEMAR NORTE LESTE SA
INTERESSADO 2 ANANDA DA LUZ FERREIRA
EMENTA: Incidente de uniformização de jurisprudência. Interpretação do novo art. 475- J do Código de Processo Civil. Fixação do termo “a quo” para a contagem do prazo de 15 (quinze) dias para ensejar a incidência da multa. Momento a ser estabelecido de forma inequívoca e em harmonia com o sistema processual. A intimação é o termo inicial do prazo. Exegese compatível com a regra do art. 240 do Código de Processo Civil. Natureza do ato a ser praticado. Tratando-se de intimação para a prática de ato material, de caráter personalíssimo, a diligência é de ser realizada na pessoa do próprio executado. Tais regras têm aplicação à execução provisória prevista no art. 475-O da lei processual. Incidente conhecido. Interpretação fixada por maioria simples. Não estabelecimento de súmula.
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Representação por
Inconstitucionalidade nº. 07/2007, em que é Requerente EGRÉGIA 6ª CÂMARA CÍVEL DO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Interessado 1 TELEMAR NORTE
LESTE SA e Interessado 2 ANANDA DA LUZ FERREIRA,
ACORDAM, por maioria simples de votos, os Desembargadores que compõem o Egrégio Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em conhecer do incidente para fixar interpretação no sentido de que o termo “a quo” para a incidência da multa prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil é a intimação pessoal do executado, aplicando-se tal regra à execução provisória prevista no art. 475-O do mesmo diploma legal, vencidos os Desembargadores Relator, Antônio Duarte Ferreira Duarte, Valmir de Oliveira, Sérgio Lucio de Oliveira Cruz, Leila Maria Mariano, Paulo Gustavo Rebello Horta, Letícia de Faria Sardas, Wany do Couto Faria e Miguel Ângelo Barros. Não foi alcançado o quórum de maioria absoluta para o estabelecimento de enunciado sumular.
Relatório
§
Trata-se de uniformização de jurisprudência suscitada com base no art. 476, II do CPC a respeito da nova redação dos novos dispositivos dos arts. 475-J e 475-O do CPC, alterados pela Lei 11.232/2005.
O incidente foi suscitado pela 6ª Câmara Cível desse Tribunal de Justiça, no julgamento do agravo de instrumento interposto contra decisão que impôs a incidência de multa de 10% sobre o valor da condenação ao devedor que não efetuou o pagamento no prazo de 15 dias contados da data do despacho determinando o cumprimento do acórdão, sem que tenha sido intimado. Confira-se a ementa (fIs. 199):
"Direito Processual Civil. Uniformização de Jurisprudência. Decisões divergentes dos diversos órgãos fracionários. Cumprimento de sentença. Condenação pecuniária. Depósito de valor a menor. Impugnação intempestiva. Determinação da multa de 10%, prevista no art. 475-J, do Código de Processo Civil, somada ao valor da diferença da dívida. Alegação de que a intimação deve ser feita pessoalmente ao devedor. O incidente de uniformização de jurisprudência instaura-se quando se verifica a ocorrência de divergência ou de interpretação diversa entre os diversos órgãos fracionários sobre objeto do julgamento. Acolhimento do incidente suscitado pelo relator com a remessa dos autos ao egrégio Órgão Especial."
A Câmara identificou divergência entre os órgãos fracionários do Tribunal, apontando a existência de duas questões a serem pacificadas, relativas à inteligência do art. 475 J do CPC, quais sejam, (I) se há necessidade de intimação da parte para pagamento de quantia certa decorrente de condenação, esclarecendo se esta intimação deve ser pessoal ou na pessoa do seu procurador, e (II) se a norma se aplica também às execuções provisórias. Colaciona diversos arestos para demonstrar a necessidade de uniformização.
É o relatório.
Voto
Conforme se verifica dos diversos pronunciamentos trazidos à baila pela Egrégia 6ª Câmara Cível, há enorme divergência no tocante ao tema, restando, portanto, a admissão deste incidente, nos termos do art. 477 do CPC.
O primeiro ponto a ser analisado é o da fixação do termo “a quo” para a incidência da multa, existindo a tal respeito dois básicos entendimentos.
O Superior Tribunal de Justiça, ainda que por entendimento não pacificado, entende que o “dies a quo” é o do trânsito em julgado da decisão.
Veja-se:
“LEI 11.232/2005. ARTIGO 475-J, CPC. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. MULTA. TERMO INICIAL. INTIMAÇÃO DA PARTE VENCIDA. DESNECESSIDADE.
1. A intimação da sentença que condena ao pagamento de quantia certa consuma-se mediante publicação, pelos meios ordinários, a fim de que tenha início o prazo recursal. Desnecessária a intimação pessoal do devedor.
2. Transitada em julgado a sentença condenatória, não é necessário que a parte vencida, pessoalmente ou por seu advogado, seja intimada para cumpri-la.
3. Cabe ao vencido cumprir espontaneamente a obrigação, em quinze dias, sob pena de ver sua dívida automaticamente acrescida de 10%.” (REsp 954859 / RS; Ministro Humberto Gomes de Barros).
No entanto, neste Tribunal de Justiça encontram-se, além de decisões que seguem o entendimento do Colendo STJ, diversos arestos estabelecendo que é de ser considerado como termo inicial a data da intimação do devedor, dividindo-se o entendimento entre a intimação através de seu advogado e a intimação pessoal do próprio devedor.
“Agravo de Instrumento. - Execução fundada em título judicial. - Necessária a intimação pessoal do devedor. - O Art. 475-J do CPC omitiu-se quanto à forma de intimação do devedor e não alterou as disposições pertinentes às comunicações dos atos processuais
(Capítulo IV). - As intimações, pela imprensa, dizem respeito aos advogados, possibilitando a prática dos atos que lhe dizem respeito, como patronos (atos postulatórios) e somente a eles, por serem obrigados à leitura do D.O. - As comunicações das decisões que, por sua natureza, envolvam obrigações a serem prestadas diretamente pela parte, continuam exigindo a intimação pessoal desta. - Considerando que, no caso, a intimação seria para pagar dívida em 15 dias, sob pena de multa, o que só à parte caberia fazer, é inócua a intimação do advogado. - Não está o advogado obrigado a pagar dívidas de seus clientes, nem constituiria um fato sobrenatural a circunstância de não conseguir o causídico comunicar, a seu cliente, no prazo previsto para o pagamento, o conteúdo da intimação que lhe foi feita. - Por outro lado, a ausência de intimação da parte faz correr, à socapa, um prazo vital para ela, o que fere, às escâncaras, o princípio constitucional da ampla defesa. - Recurso provido. (AI nº 2007.002.27858; 13ª Câmara Cível; Rel. Des. José de Samuel Marques)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. LEI 11.232/05. PRAZO DE 15 DIAS PARA PAGAMENTO DO DÉBITO SOB PENA DE MULTA DE 10% SOBRE O VALOR DA EXECUÇÃO. ARTIGO 475-J DO CPC. TERMO INICIAL PARA A CONFIGURAÇÃO DA MORA. EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO PARA CUMPRIMENTO.
Versa a controvérsia recursal sobre o cumprimento de sentença sob a égide dos artigos 475-J e seguintes, do Código de Processo Civil, incluídos pela Lei 11.232/2005, notadamente quanto a necessidade de intimação da parte devedora para cumprimento da sentença. A despeito da controvérsia doutrinário-jurisprudencial ainda existente acerca do tema, certo é que segundo a jurisprudência majoritária deste E. Tribunal Estadual – e pacífica desta E. Câmara Cível – a referida multa somente deve incidir quando o devedor não cumpra espontaneamente a obrigação no prazo de quinze dias estipulado pelo artigo 475-J, ‘caput’, do CPC, o qual deve fluir após a sua devida intimação através de seu advogado, devendo ser afastada apenas a exigência de intimação pessoal do devedor.
Trânsito em julgado da sentença condenatória não constitui em mora o devedor. Necessidade de apresentação pelo credor dos cálculos atinentes ao débito líquido e certo oriundo da condenação e de intimação do devedor, pelo seu patrono, através de Diário Oficial.
Reforma da decisão para afastar a multa aplicada ante a ausência de intimação para cumprimento da sentença.
Recurso provido, na forma do art. 557, §1º A, do CPC.” (AI nº 2007.002.26271; 2ª Câmara Cível; Rel. Des. Elisabete Filizzola).
A divergência não se situa apenas na jurisprudência, mas também na doutrina.
Parte dos processualistas sustenta que a intimação para cumprimento da sentença, observados os parâmetros acima descritos, haverá de ser feita na pessoa do seu advogado do devedor.
Nesse sentido;
Carreira Alvim, “se a sentença for líquida, o devedor deverá cumpri-la no prazo de quinze dias – contado também da intimação ao seu advogado – e, caso não o faça, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento, podendo o credor, com o demonstrativo do débito atualizado até a data do requerimento executório, requerer a expedição de mandado de penhora e avaliação”. (Alvim, Carreira, J. E.; Alterações do Código de Processo Civil, Editora Ímpetus, 2ª. ed., Rio de Janeiro, 2006, p. 175. O mesmo posicionamento foi por ele defendido na obra Cumprimento da Sentença, Comentários à nova execução da sentença e outras alterações introduzidas no Código de Processo Civil, Editora Juruá, 2006, Curitiba, p. 67.)
Cássio Scarpinella Bueno, de igual forma, sustenta que “assim, intimadas as partes, por intermédio de seus advogados, de que o ‘venerando acórdão’ tem condições de ser cumprido, está formalmente aberto o prazo de 15 dias para que o ‘venerando acórdão’ seja cumprido” (Bueno, Cássio Scarpinella; Nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil; Saraiva, p. 78) Cássio Scarpinella Bueno, ob. cit., p. 78.
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, à sua vez, não manifestam posicionamento diferente ao afirmarem que “o devedor deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado, que é o modo determinado pela Reforma da Lei nº 11232/05 para a comunicação do devedor na liquidação da sentença e na execução para cumprimento da sentença”. (Júnior, Nelson Nery e Rosa Maria de Andrade Nery; Código de Processo Civil e Legislação Processual Civil Extravagante em vigor; RT, São Paulo, 2006, p. 641)
Sérgio Ricardo de Arruda Fernandes afirma que “a intimação pessoal é exceção no sistema processual e exige, para esse fim, regra específica. No caso do art. 475-J, a lei não se refere expressamente à intimação do devedor, de modo que não cria, naturalmente, a exigência de intimação pessoal”. (Fernandes, Sérgio Ricardo de Arruda; Os atos de comunicação processual do devedor na disciplina da Lei nº 11.232)
Parte da doutrina sustenta ainda que não há necessidade de intimação, uma vez que o prazo para cumprimento da obrigação se inicia do transito em julgado, ou seja, quando ela se torna exigível.
Guilherme Rizzo Amaral e Marcio Louzada Carpena, ao prelecionarem acerca da análise ao artigo 475-J, dizem que “o dispositivo também não indica a necessidade de intimação específica para cumprimento voluntário da sentença, fazendo referência apenas à “condenação” do devedor e seu eventual descumprimento. Todavia, uma vez transitada em julgado a sentença (ou acórdão), cremos ser desnecessária a intimação do devedor para cumprí-la, bastando a simples ocorrência do trânsito em julgado para que se inicie o prazo de 15 (quinze) dias para o cumprimento voluntário.” (Amaral, Guilherme Rizzo e Marcio Louzada Carpena; A Nova Execução, Comentários à Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, colaboradores que escreveram sobre a coordenação de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, Editora Forense, Rio de Janeiro, 2006, p. 112.)
Araken de Assis defende que o prazo para cumprimento da obrigação teria inicio a partir do momento em que a obrigação imposta no titulo judicial tornar-se exigível. Dessa forma, se a decisão, embora eficaz, ainda comporta algum recurso, não passaria a fluir automaticamente o prazo previsto no artigo 475-J. (Assis, Araken de; Cumprimento da Sentença, Forense, 2006, p. 212)
Luiz Fux afirma que após o decurso do prazo legal para o cumprimento da obrigação, quer pelo trânsito em julgado, quer pelo fato do recurso não ser dotado de efeito suspensivo, a protelação do vencido depois de intimado da decisão judicial importará na aplicação da multa coercitiva.
(Fux, Luiz; A Reforma do Processo Civil, Impetus, 2006, p. 111.)
Outra parte, no entanto, sustenta que o termo inicial do prazo situa-se no ato de intimação pessoal do devedor.
Nesse sentido:
Alexandre Freitas Câmara, afirma que o termo inicial do prazo de 15 dias para pagamento voluntário da obrigação é da intimação pessoal do devedor. (Alexandre Freitas Câmara, A Nova Execução de Sentença, 3ª ed., Lúmen Iuris, 2006, p.115)
Luiz Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel G. Medina também entendem que a interpretação da norma processual deve amoldar-se à realidade fática, propiciando a realização mais célere e simples do direito. Deve-se privilegiar a ideia de se permitir o desenvolvimento mais simples do processo e que seja menos suscetível de gerar incidentes processuais desnecessários. Nas suas visões, o executado não é intimado para pagar ou nomear bens à penhora, mas simplesmente para cumprir a obrigação. Desta forma, é necessária a intimação do executado para que este cumpra a sentença. Além disso, entendem que a intimação para o cumprimento da sentença deve se dar na pessoa do devedor, e não deve ser feita através de seu advogado. (Wambier, Luiz Rodrigues, Teresa Arruda Alvim Wambier e José Miguel G. Medina; Breves comentários à nova sistemática processual civil – 2, RT, 2006; especificamente sobre o novo regramento da liquidação e do cumprimento da sentença, cf. Luiz Rodrigues Wambier, Sentença civil – Liquidação e cumprimento, 3. ed., RT, 2006; sobre as alterações oriundas da nova Lei do agravo (Lei 11.187/05), cf. Teresa Arruda Alvim Wambier, Os agravos no CPC, 4. ed., RT, 2005.)
Semelhantemente, Cândido Rangel Dinamarco ao afirmar que “distinguem-se casos em que a intimação é feita à própria parte e casos em que se intima o advogado na qualidade de defensor e representante judicial desta. O critério central dessa distinção é a natureza dos atos a realizar. Quando se trata de atos de postulação, para os quais a parte não tem capacidade [...], a intimação tem por destinatário o advogado – intimação de decisões, sentenças, designações, prazo para requerer provas ou formular quesitos ao perito etc. Para os atos personalíssimos intima-se a parte em si mesma, como no caso de comparecimento para depor em audiência ou para submeter-se a perícia médica etc.” E prossegue: “Intimações de estrutura complexa são passadas ao sujeito de quem o juiz exige alguma conduta, que serão (a) as próprias partes, em caso de medida urgente impondo-lhes determinada conduta ou a entrega de um bem, (b) as testemunhas, para que compareçam, (c) ao perito, para que apresente o laudo e restitua os autos do processo etc.” (Instituições de direito processual civil, v. III, 3ª ed., Malheiros, 2003, p. 431-432).
Nessa linha de entendimento colecionam-se os seguintes arestos do nosso Tribunal:
“Execução por quantia certa fundada em título judicial. Imposição da multa de que cuida o artigo 475-J, do Código de Processo Civil, na redação da Lei 11.232/2005. Intimação procedida na pessoa do advogado do devedor. Agravo de instrumento. Não tendo o legislador da reforma aproveitado a oportunidade para estabelecer, expressamente, uma exceção ao principio segundo o qual deve-se intimar a parte pessoalmente sempre que a finalidade da comunicação processual for provocar a prática de um ato que a ela caiba realizar pessoalmente como, sem qualquer dúvida, é o ato de cumprir a sentença ... ( cfr. Alexandre Câmara antes transcrito ), deve-se, numa interpretação sistemática, se fazer incidir a mencionada regra geral, embora o escopo de celeridade que, nitidamente, presidiu a reforma introduzida pela Lei 11.232/2005, comunicando-se à parte, pessoalmente, os atos que deva ela praticar, salvo a hipótese de poderes especiais conferidos a seu advogado. E tudo isso a partir do trânsito em julgado da sentença a ser cumprida, pela singela razão de que, enquanto aberta ao vencido a via recursal disponibilizada pelo ordenamento jurídico para a respectiva impugnação, não soaria razoável mas contraditório até impor-lhe a coima enquanto dela se utiliza. Recurso provido.” (TJRJ, 2ª Câmara Cível, Rel. Des. Maurício Caldas Lopes)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. Execução de título judicial. Divergências doutrinárias e precedentes jurisprudenciais sobre a intimação do devedor. Interpretação do art. 475-J do CPC. A intimação pessoal atende superiormente ao princípio do devido processo legal (CF/88, art. 5º, LIV) e se harmoniza com a regra do art. 2º, §§ 1º e 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil. Recurso a que se dá provimento, por maioria.” (TJRJ, 2ª Câmara Cível, Rel. Des. Jessé Torres)
Pela precisão com que tratou a questão é de ser reproduzido, como razões de decidir, o voto do Des. José de Samuel Marques ao julgar o agravo de instrumento nº 28.858/2007, “verbis”:
“Outra conduta é a cominar ao devedor a pena consistente em multa de 10% sobre o valor exigido, caso a dívida não seja quitada em 15 (quinze) dias.
Ninguém tem dúvida de que a celeridade do processo foi o móvel da promulgação da Lei nº 11.232 de 2005, que incluiu, em nosso direito positivo, a norma acima citada.
Não creio que exista algum operador do direito que se insurja contra a celeridade do processo.
A questão, entretanto, surgiu, a meu sentir, sem nenhuma razão, em se saber se o prazo de 15 dias, em se tratando de processo decidido em última instância pelo Tribunal de Justiça, como no caso presente, começaria a fluir da data da publicação do acórdão ou da intimação pessoal da parte.
José Carlos Barbosa Moreira, in ‘O Novo Processo Civil Brasileiro’ (V - Cominação de multa), nos fala da relevância de se definir, com precisão, este termo inicial, assim se referindo à questão:
'Ponto de grande importância, mas a cujo respeito guarda silêncio a lei, é o do termo inicial para a incidência da multa.
Continua, mais adiante, o festejado jurista:
‘Afigura-se preferível situar o ‘dies a quo’ da incidência em momento inequívoco. Daí optarmos pela necessidade de intimar-se o executado – o que se harmoniza por sinal com o disposto no art. 240 caput, a cuja luz, salvo disposição em contrário, os prazos para as partes contar-se-ão da intimação’.
De fato, a solução da questão exige reflexão sobre a finalidade e forma da intimação, já que o Código não é composto por partes estanques e os artigos de um diploma legal devem harmonizar-se uns com os outros.
Quando isto não ocorre, diz Carlos Maximiliano in ‘Hermenêutica e Aplicação do Direito’ nº 140:
‘Sempre que descobre uma contradição, deve o hermeneuta desconfiar de si; presumir que não compreendeu bem o sentido de cada um dos trechos ao parecer inconciliáveis, sobretudo se ambos se acham no mesmo repositório.
Incumbe-lhe preliminarmente fazer tentativa para harmonizar os textos; a este esforço ou arte os Estatutos da Universidade de Coimbra, de 1772, denominavam Terapêutica Jurídica.
No caso, não houve contradição entre a nova norma, a estrutura e as demais disposições do Código.
Como deve ser observado, o art. 475-J CPC não trata de intimação e isto porque as intimações são regidas pelos artigos 234 a 242 do mesmo Código, que o novo legislador quis manter intocáveis.
Vejamos como dispõe o artigo 240, que trata da intimação:
‘Art. 240 - Salvo disposição em contrário, os prazos para as partes, para a Fazenda Pública e para o Ministério Público contar-se-ão da intimação.’
Não pode passar despercebido que, no caso, não há disposição em contrário.
Não se justifica, assim, ver no art. 475-J uma exceção à regra geral, mormente sob o falso argumento de conter o mesmo uma exceção implícita.
Nunca é demais lembrar os ensinamentos de Maximiliano in ‘Hermenêutica e Aplicação do Direito’ nº 141:
'Prefere-se o trecho mais claro, lógico, verossímel, de maior utilidade prática e mais em harmonia com a lei em conjunto os usos, o sistema do Direito vigente e as condições normais da coexistência humana. Sem embargo da diferença de data origem e escopo, deve a legislação de um Estado ser considerada como um todo orgânico exequível, útil, ligado por uma correlação natural.'
Vê-se, assim, que tudo nos leva ao artigo 240 do CPC, com a exigência da intimação pessoal.”
O cumprimento da obrigação não é efetivamente ato processual a ser praticado por advogado, mas ato da parte. Ou seja, o ato de cumprimento ou descumprimento do dever jurídico é algo que somente pode ser exigido da parte, e não de seu advogado, salvo se houvesse exceção expressa a respeito, o que inexiste no art. 475-J, “caput”, do CPC.
A mera intimação do advogado, pelo Diário da Justiça, não pode ser considerada como instrumento hábil e adequado à imprescindível comunicação da obrigação à parte, sob pena de se perpetrar ruptura do sistema constitucional de garantias processuais.
(Sobre a Incidência do Art. 475-J às Execuções Provisórias)
No que tange a incidência do art. 475-O do CPC, ressaltando desde logo que não tendo transitado em julgado a decisão condenatória a deflagração da execução provisória dependerá sempre da iniciativa do credor, as suas regras são as mesmas da execução definitiva. Aliás, este é o dispositivo expresso:
475-O do CPC - “A execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas:”
Assim, se a execução provisória deve seguir o procedimento que o da definitiva, a sua deflagração dar-se-á também, para os efeitos da multa, por intimação pessoal do devedor.
(Dispositivo)
Por todas essas circunstâncias é que se conhece o incidente, decidindo-se que o termo inicial para a incidência da multa é a intimação e que esta deverá ser feita na pessoa do devedor e que tal sistemática aplica-se à execução provisória.
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