1) Antes da reforma da execução de título extrajudicial (lei 11.382/2006), foi submetida ao STJ a questão consistente em saber se a existência de procedimento arbitral em que se discutia matéria referente à obrigação constante de título executivo extrajudicial teria o condão de suspender execução em curso. Eis os detalhes da espécie:
- Não adimplida obrigação constante de contrato de compra e venda de ações - título executivo extrajudicial - foi proposta a ação de execução.
- Referido contrato estipulava preço variável e continha cláusula arbitral (rectius: compromissória).
- Após o início da execução, instaurou o executado procedimento arbitral para dirimir a questão concernente ao preço.
- A exequente suscitou à Câmara Arbitral o ponto relativo à sua incompetência para examinar a matéria, de conteúdo idêntico ao suscitável em embargos à execução. A existência antecedente do processo judicial, sustentou-se, atribuiria ao juízo da execução a competência para a apreciação do tema, que haveria de ser arguido somente em embargos.
- A Câmara Arbitral deu-se por competente invocando três fundamentos, a saber :
- 1) Existência de Cláusula Arbitral (rectius: compromissória) válida e consequente impossibilidade de 'renúncia unilateral' à via arbitral.
- 2) Grande parte das cláusulas arbitrais constam de contratos que se consubstanciam em títulos executivos extrajudiciais. Se acolhida a tese do exequente, bastaria a um dos contratantes propor a execucão para que "a escolha pela arbitragem virasse letra morta".
- 3) Assim como a cláusula compromissória não retira do contrato a característica de ser título executivo, também a existência de execucão em curso não impede a propositura de ação de conhecimento e, portanto, a cognição da matéria também por Câmara Arbitral.
-
- Como o "procedimento arbitral instaurado teria o mesmo objeto de eventuais embargos à execução", requereu o executado a suspensão do feito ao judiciário, inclusive com base em "obiter dictum"1 da Câmara Arbitral, que indicara a correção de semelhante providência:
- "De todo modo, a solução parece ser dada pelo artigo 791 do Código de Processo Civil que trata dos casos nos quais há suspensão da Execução, com a remissão ao artigo 265 (...)"
-
- Duas haviam sido as ações de execução propostas. Numa, determinou-se a suspensão em sede de Mandado de Segurança contra ato judicial. Noutra, indeferiu-a o TJSP, reformando, em julgamendo de agravo de instrumento, decisão de primeira instância, em acórdão cuja ementa se transcreve:
- Questão prejudicial - execução por título extrajudicial - invocação de Câmara de Arbitragem - circunstância que não possui o efeito de suspender a execução - inaplicabilidade da regra do art. 265, inc. IV, 'a', do CPC. Agravo provido para cassar a decisão suspensiva.
-
2) Em sede de Medida Cautelar dirigida ao Superior Tribunal de Justiça, decidiu monocraticamente a eminente Ministra Nancy Andrighi que a existência de procedimento arbitral versando sobre a obrigação constante de título extrajudicial teria o condão de suspender a execução em curso. Do pronunciamento, colhe-se:
"(...)é inegável que há prejudicialidade externa entre a ação de execução e o procedimento que se desenvolve perante a Câmara Arbitral. A decisão que será proferida pelos árbitros diz respeito exatamente ao débito que é perseguido na execução. Assim, ao menos em princípio, o resultado do procedimento arbitral produzirá efeitos diretos sobre o prosseguimento da ação de execução.
(...)A discussão a respeito do assunto, destarte, deve implicar a suspensão da execução. A hipótese é de todo equivalente àquelas em que há uma ação declaratória em trâmite, e a posterior propositura de ação de execução para cobrança do débito discutido. É firme a jurisprudência no sentido de ser possível, nesses casos, atribuir à prévia ação declaratória a eficácia de embargos do devedor, com aconseqüente suspensão da execução, após a penhora. Nesse sentido, citem-se, por todos, os seguintes precedentes do STJ: AgRg no REsp 697753/SC, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª Turma, DJ de 9/5/2005; CC 38045/MA, 1ª Seção, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 9/12/2003; e REsp 260042/SP, 3ª Turma, Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 23/10/2000."
(Clique sobre os números dos precedentes supracitados para ler a íntegra.)
(Link: Íntegra da decisão Proferida na MC-13274 em PDF)
3) Dado que a lei 11.382/06 retirou dos embargos à execução o efeito suspensivo "automático" (ope legis) sobreveio a questão de saber se, no presente quadro normativo, a só existência de procedimento arbitral em curso é (ou continua a ser) causa de suspensão da execução. A respeito, Elias Marques de Medeiros Neto e Maria Rita de Carvalho Drummond:
"(...)de acordo com a legislação em vigor, entendemos que o simples fato de existir uma ação de conhecimento, seja perante o árbitro ou o juiz estatal, cujo objeto seja o questionamento da liquidez, certeza e exigibilidade de débito executado perante o Judiciário, não implica necessariamente a suspensão do trâmite da ação de execução. Pelo regime em vigor, caberá ao julgador observar os requisitos do artigo 739-A do Código de Processo Civil para decidir acerca da suspensão da execução judicial."
in: Ação de execução de título extrajudicial não impede uso de arbitragem.
1. "(...) afigura-se fundamental a distinção entre 'ratio decidendi' e 'obiter dictum', tendo em vista a necessidade ou a imprescindibilidade dos argumentos para formação da decisão obtida. (Cf. sobre o assunto, Winfried Schülter, Das Obiter Dictum, Munique, 1973, p. 77 s). Embora possa haver controvérsias sobre a distinção entre 'ratio decidendi' e 'obiter dictum', é certo que um critério menos impreciso indica que integra a 'ratio decidendi' premissa que não possa ser eliminada sem afetar o próprio conteúdo da decisão. (Cf, Schülter, op. cit. p., p.85), Gilmar Ferreira Mendes, excerto de voto nos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinádio 194.662-8.
COMENTÁRIOS