Em novembro de 2009, analisou-se, neste blog, o então novo entendimento do STJ acerca do termo a quo da multa do art. 475-J do CPC. Em março de 2010, sobreveio notícia dando conta de que a Corte Especial daquele Tribunal versou a matéria no julgamento do REsp 940.274/MS, cujo acórdão ainda não foi publicado. Tal pronunciamento, anuncia-se, terá o condão de pacificar a questão (aparentemente no sentido de ser necessária e suficiente a intimação do devedor na pessoa de seu advogado, via diário de justiça).
( Atualização. Publicada, após a elaboração do presente texto, a supramencionada decisão da Corte Especial, constatou-se que ela apenas consagrou o entendimento da 4ª turma, já versado em: multa do art. 475-J. Novo Entendimento do STJ, que se atualizou para registrar o novo precedente.)
Tem-se de atender, porém, a que a nem todas as hipóteses aplica-se a ratio decidendi do referido pronunciamento. Há suportes fáticos não alcançados por ela, e terá o STJ de analisá-los em outras assentadas. No item 4 do supracitado trabalho voltado ao tema, disponibilizou-se esquema ilustrativo das variáveis a serem tomadas em consideração para a resolução do problema. Nesta sede, calha reproduzir a área relativa aos “casos especiais”:
( Texto atualizado em 21/08/11, para incorporar julgado da 3ª Turma do STJ sobre a questão.)
Bem se vê, espera-se, que não pode o aplicador estender o pronunciamento da Corte Especial a todo e qualquer caso em que se suscite o problema da necessidade de intimação pessoal do devedor, para que tenha início o prazo do art. 475-J do CPC. Para explicitar o ponto, destacar-se-á, no presente texto a questão atinente ao representado por defensor público. Veremos doutrina e jurisprudência (inclusive de um mesmo Tribunal) dissonantes sobre a matéria. Em síntese, há quem:
repute imprescindível a intimação pessoal do devedor representado por Defensor Público, ante:
a inexistência de mandato;
as dificuldades de as Defensorias contatarem os jurisdicionados que representam;
considere suficiente a intimação pessoal do Defensor Público, e despicienda a do devedor.
1) Pela Necessidade De Intimação Pessoal do Devedor Representado Por Defensor Público, para que se Inicie o Prazo de 15 Dias do Art. 475-J do CPC.
1.1) Doutrina
Américo Andrade Pinho, A necessidade de intimação pessoal, no âmbito do art. 475-J, caput, do CPC, do devedor representado pela Defensoria Pública, in Aspectos Polêmicos da Nova Execução, vol. 4, ed. RT, 2008, coord Teresa Arruda Alvim Wambier e Cássio Scarpinella Bueno.
1.1.1) Inexistência de Mandato Outorgado ao Defensor Público
Ainda assim, é certo que a forma de representação judicial do necessitado pela Defensoria Pública não é, em essência, idêntica àquela prestada por advogado constituído, residindo neste ponto o aspecto jurídico a ser considerado para tornar necessária, no âmbito do art. 475-J do CPC, a intimação pessoal do devedor.
É que, com efeito, não se pode deixar de considerar que a relação existente entre a parte o Defensor Público, ou Procurador do Estado que exerça esse mister, não possui os mesmos contornos que aquela verificada entre a parte/cliente e o advogado constituído, embora, claro, viabilize a representação processual.
Vai daí, e este se afigura o ponto mais importante, que por ausência de mandato outorgado pela parte ao Defensor Público não é dado a este, à luz do disposto no art. 38 do Código de Processo Civil, confessar, transigir ou renunciar ao direito em que se funda a ação, entre outros atos relevantes com aptidão para implicar disponibilidade do direito controvertido, a tanto equivalendo, segundo pensamos, o recebimento de intimação para atendimento de obrigação eminentemente material (pagamento) em prazo de quinze dias, sob pena de agravamento da situação da parte com a imposição de multa pecuniária de 10% sobre o total.
Parece-nos, pois, que a intimação dirigida ao devedor, para pagamento do débito em quinze dias sob pena de multa, será ineficaz se endereçada ao Defensor Público, afigurando-se imprescindível, na hipótese, a intimação pessoal daquele, por oficial de justiça ou correio.
1.1.2) Dificuldade de Contato com o Devedor Assistido Pela Defensoria Pública
Ao lado desse aspecto jurídico já ressaltado, há outro, de ordem prática, que não é de ser desconsiderado.
Com efeito, os cidadãos assistidos pela Defensoria Pública, no mais das vezes, aliam à hipossuficiência financeira também uma menor noção de diversos aspectos comezinhos do cotidiano, claro que involuntariamente, em decorrência da própria falta de cultura de que também são vítimas, por questões sociais diversas cuja exposição não cabe aqui.
Encaram o serviço que lhes é prestado sem a devida importância, deixando, com bastante frequência, de comunicar ao órgão estatal eventuais mudanças de endereço, ou mesmo de indicar formas alternativas pelas quais possam ser localizados.
Tal fato, aliado às diversas dificuldades decorrentes da própria estrutura do Poder Público como um todo (ressalvadas, como sempre, as exceções decorrentes de peculiaridades de cada região do país), faz com que se torne impossível, de forma bastante comum, o contado entre o Defensor Público e a parte por ele assistida, o que tornaria a intimação do devedor, por assim dizer, uma ficção, o que por certo não é desejado pelo sistema.
1.2) Jurisprudência
TJRJ, 19ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento 0062077-31.2009.8.19.0000, rel. Des. Claudio Brandão, j. 09/03/2010:
Agravo de Instrumento. Art. 475-J do CPC. Prazo de 15 dias para pagamento do débito sob pena de multa de 10% sobre o valor da execução. Decisão que determinou a intimação do Defensor Público para que o devedor, seu assistido, cumpra a obrigação imposta na sentença. Pedido de intimação pessoal da parte devedora. Diante das peculiaridades que envolvem a assistência jurídica gratuita prestada pela Defensoria Pública, a intimação do Defensor Público não prescinde da intimação pessoal do assistido no que tange aos atos privativos da parte. Necessidade de intimação pessoal do devedor. Provimento do recurso.
TJRJ, 20ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento 0011803-34.2007.8.19.0000 (2007.002.36150), rel. Des. Letícia Sardas, j. 17/09/2008:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO PROFERIDA NA FASE DE EXECUÇÃO. INTIMAÇÃO PARA CUMPRIMENTO DO JULGADO - ART. 475-J DO CPC. PARTE PATROCINADA PELA DEFENSORIA PÚBLICA. INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR. INFRINGÊNCIA. PROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES DA CORTE ESTADUAL.
1. Constatada a inadequada interpretação dos fatos da lide, cabe o acolhimento dos declaratórios, com efeitos modificativos.
2. Se a decisão embargada omitiu ponto sobre o qual deveria ter-se manifestado o julgador, ou se incorreu em contradição ou obscuridade, através da integrativa decisão proferida no julgamento dos Embargos de Declaração, corrige-se a decisão.
3. A decisão embargada manteve a decisão monocrática proferida por esta Relatora que confirmou a decisão proferida pelo juízo a quo, no sentido de, na fase de execução da sentença, ser suficiente a intimação do advogado da parte, sem necessidade de intimação pessoal da executada.
4. Por um lapso, no entanto, não se verificou que a parte é assistida pela Defensoria Pública.
5. Como ressaltado pelo JDS. DES. ANTONIO ILOIZIO BARROS BASTOS, embora ainda exista controvérsia sobre a intimação para os fins do art. 475-J do CPC, se destinada à parte ou somente ao seu patrono, o fato é que há de se atentar para a especificidade do trabalho do Dr. Defensor Público, que muitas vezes não tem contato nem conhece a parte assistida. E o pagamento é providência exclusiva da parte e não do Defensor.
6. Provimento dos Embargos de Declaração.
2) Pela Desnecessidade de Intimação Pessoal do Devedor Representado por Defensor Público
2.1) Jurisprudência
TJRJ, 16ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento 0029421-21.2009.8.19.0000 (2009.002.27643), rel. Des. Mário Robert Mannheimer, j. 13/10/2009
Processo Civil. Agravo Inominado (art. 557, § º do CPC). Cumprimento de sentença condenatória.
Intimação do devedor, na pessoa do Defensor Público, para cumprir o disposto no art. 475-J do CPC. Possibilidade.
A intimação para cumprimento da sentença não necessita ser feita na pessoa do devedor, mas de seu patrono constituído nos autos, de acordo com a regra geral do artigo 475-A, adotada com claro propósito de promover a efetividade e a celeridade processual na Execução, que foi o objetivo das recentes reformas processuais.
O Defensor Público já ostenta a prerrogativa da intimação pessoal e haveria evidente rompimento do equilíbrio processual se nova intimação fosse feita ao seu assistido.
Conhecimento e desprovimento do recurso.
Atualização do dia 21/08/11.
STJ, 3ª Turma, Resp. 1.032.436/SP, DJe de 15/08/11, relatora Ministra Nancy Andrighi:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. TRÂNSITO EM JULGADO ANTERIOR. INTIMAÇÃO PARA PAGAMENTO OCORRIDA NA VIGÊNCIA DA LEI 11.232⁄2005. MULTA DO ART. 475-J. APLICABILIDADE. INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEFENSOR PÚBLICO. SUFICIÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL CONFIGURADO.
1. Admitindo-se como termo inicial do prazo de 15 dias previsto no art. 475-J não mais o trânsito em julgado da sentença, mas a intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, se essa ocorreu na vigência da Lei 11.232⁄05, há incidência da multa.
2. Inexiste necessidade de intimação pessoal do devedor para o cumprimento da sentença, sendo válida a intimação do defensor público, desde que feita pessoalmente.
3. Recurso especial a que se nega provimento.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça, registre-se, contraria o entendimento prevalecente na doutrina quanto à incidência da multa do art. 475-J do CPC sobre os feitos cujas sentenças proferidas na fase de conhecimento sejam anteriores à entrada em vigor da Lei 11.232/05. Reputou o STJ ser devida a cominação nesta hipótese, enquanto boa parte dos juristas a considera incabível. Abordar-se-á o ponto em outra mensagem.
3) Observações Finais
Como se vê, a despeito do pronunciamento da Corte Especial do STJ sobre o termo a quo do prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC, subsistem hipóteses não abrangidas pela ratio decidendi do precedente. Dentre elas, está a do devedor representado por Defensor Público, que enseja, inclusive, recurso especial pela alínea “c”.
Parabéns pela exposição clara sobre o tema!
ResponderExcluirmuito bom.... foi exclarecida a minha duvida...
ResponderExcluirbom meus parabens mais uma observaçao ao tema digamos assim se o credor tem so um prazo de 10 dias para se manifestar para peseguir ate a liquidaççao porque razao motivo e concecuencia a parte devedora nao tem o mesmo prazo???? desde ja mto grato
ResponderExcluirÁs vezes fico a pensar.
ResponderExcluirSe eles os réus protelam tamto para liquidar uma divída mesmo sentenciados pelo sr. Juiz de direito imaginem se não houvesse o juizado especial.
parabéms viva o juizado especial