No presente texto ver-se-á que, ocorrendo cessão de crédito inter vivos depois de proposta demanda sobre ele:
no processo de conhecimento, o ingresso do cessionário como parte depende da aceitação do adversário, por força do art. 42,§1º do CPC;
na fase ou no processo de execução, há controvérsia sobre ser necessária a aquiescência da parte contrária (CPC, art. 567,II), sendo majoritário o entendimento que a reputa dispensável;
se pleiteado o ingresso do cessionário após a oposição de embargos ou de impugnação à execução, entende a doutrina que o fato de essas insurgências possuírem “caráter” de ação de conhecimento atrai a incidência do art. 42,§1º, devendo o cedente permanecer no pólo passivo da demanda a menos que o embargado ou impugnado consinta com a substituição;
partindo da premissa de que reside na natureza cognitiva da insurgência a justificativa para a aplicação do art. 42,§1º à impugnação à execução, então é possível sustentar: (a) a sua não incidência na fase de cumprimento da sentença (b) a sua incidência apenas em determinadas hipóteses, uma vez que há dissenso doutrinário e jurisprudencial sobre a natureza jurídica deste meio de impugnação.
1)Ingresso do Cessionário Durante o Processo de Conhecimento
1.1.1) Necessidade de Consentimento do Réu. Art. 42,§1º do CPC
Sérgio Shimura, A cessão de Crédito e a Legitimidade Ativa na Execuçao, in Execução Civil e Cumprimento da Sentença, vol. 3, Ed. Método, 2009:
No processo de conhecimento, o cessionário só pode ingressar em juízo, substituindo o cedente, se a parte contrária consentir (§1º do art. 42, CPC). Diferentemente, em sede de execução, o art. 567,II, CPC dispõe que pode também promover a execução, ou nela prosseguir, o cessionário, quando o direito resultante do título executivo foi-lhe transferido por ato entre vivos.
2)Ingresso do Cessionário Durante o Processo de Execução (ou Fase de Cumprimento da Sentença)
2.1) A Favor da Desnecessidade do Consentimento do Executado (art. 567,II do CPC)
REsp 726535/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/04/2007, DJ 30/04/2007 p. 301:
PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO DE SENTENÇA – CESSÃO DE CRÉDITO – PRECATÓRIO – PEDIDO DE HABILITAÇÃO DO NOVO CREDOR – DESNECESSIDADE DA ANUÊNCIA DO DEVEDOR.
1. Os arts. 41 e 42 do CPC, que dizem respeito ao processo de conhecimento, impuseram como regra a estabilidade da relação processual e, havendo cessão da coisa ou do direito litigioso, o adquirente ou o cessionário somente poderão ingressar em juízo com a anuência da parte contrária.
2. No processo de execução, diferentemente, o direito material já está certificado e o cessionário pode dar início à execução ou nela prosseguir sem que tenha que consentir o devedor.
3. Os dispositivos do Código Civil (art. 290 do CC/2002 e 1069 do CC/1916), que regulam genericamente a cessão de crédito como modalidade de transmissão das obrigações, não se aplicam à espécie, mas o Código de Processo Civil, que é norma especial e dispôs diversamente quando se trata de cessão de crédito sub judice.
4. Recurso especial improvido.
REsp 588321/MS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/08/2005, DJ 05/09/2005 p. 399:
Direito processual civil. Recurso especial. Ação de execução. Cessão de crédito. Substituição de partes. Ausência de notificação. Conhecimento pelo devedor. Anuência desnecessária.
- A cessão de crédito não vale em relação ao devedor, senão quando a ele notificada, contudo, a manifestação de conhecimento pelo devedor sobre a existência da cessão supre a necessidade de prévia notificação. Precedentes desta Turma.
- Em consonância com o disposto no art. 567, II, do CPC, pode ser dispensada a anuência do devedor quando formulado pedido de substituição do pólo ativo do processo de execução, pois este ato processual não interfere na existência, validade ou eficácia da obrigação.
Recurso especial conhecido e provido.
Do voto da eminente relatora, transcreve-se:
Resta, ainda, discutir o segundo fundamento apresentado pelo Tribunal de origem para justificar a indeferimento da substituição de partes, qual seja: a falta de anuência da parte contrária.
O dispositivo legal aplicado pelo TJ⁄MS foi o art. 42, § 1º do CPC, que estabelece a necessidade da parte contrária consentir com a substituição, no processo, do cedente pelo cessionário.
Contudo, o art. 567, II, do CPC dispõe que pode também promover a execução, ou nela prosseguir, o cessionário, quando o direito resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos, não exigindo a anuência da outra parte para o ingresso do cessionário no processo de execução em substituição ao cedente.
Na hipótese, lida-se em sede de processo de execução e embargos do devedor, por isso aplicável a norma específica sobre a matéria (art. 567, II) no Livro II do CPC, que regula o processo de execução, desprezando-se a regra geral que disciplina o processo de conhecimento e outros, onde não houver regra específica. observada no processo de conhecimento.
Ademais, a substituição do pólo ativo da execução não gera prejuízo ao devedor, porque este ato processual não trisca na existência, validade ou eficácia da obrigação de pagar e só por isso é dispensada a anuência.
2.2) A Favor da Necessidade do Consentimento do Executado, com base na incidência do art. 42,§1º também na Execução
REsp 955005/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/02/2008, DJe 24/03/2008:
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CESSÃO DE DIREITO SOBRE CRÉDITO-PRÊMIO DE IPI. INCLUSÃO DE EMPRESAS CESSIONÁRIAS NO PÓLO ATIVO DA EXECUÇÃO DA SENTENÇA. AÇÃO ORDINÁRIA (DECLARATÓRIA) TRANSITADA EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CONSENTIMENTO EXPRESSO DA FAZENDA. NÃO-CONFIGURAÇÃO DA PRECLUSÃO PRO JUDICATO.
1. Tratam os autos de agravo de instrumento interposto por União Com./Imp./Exp. Ltda. em face de decisão do juízo singular que indeferiu pedido de inclusão, no pólo ativo da execução da sentença proferida na Ação Ordinária n. 89.00.13622-4, de empresas cessionárias de direitos de créditos-prêmio de IPI reconhecidos em decisão judicial. O TRF/4ª Região negou provimento ao agravo.Recurso especial da empresa apontando violação dos arts. 471, 473 567, II, e 42, § 2º, do CPC além de dissídio pretoriano. A empresa recorrente, cessionária dos direitos reconhecidos referentes ao crédito-prêmio IPI, invoca, primeiro, violação do artigo 567, II, do CPC afirmando que como se cuida de execução de título judicial, a questão atinente à substituição processual pleiteada há de ser definida na forma do preceito citado e, segundo, alega nulidade da decisão que revogou o decisório que deferiu a substituição processual, sustentando, nesse âmbito, violação dos artigos 471 e 473, do CPC.
2. O objeto de discussão no recurso especial é a possibilidade de inclusão da empresa cessionária no pólo ativo da execução de sentença já transitada em julgado. Pretende futuramente proceder à compensação dos valores próprios que lhe foram cedidos (créditos-prêmio de IPI) com débitos de terceiros. Alega-se, ainda, afronta aos artigos 471 e 473, do CPC por configuração da preclusão pro judicato.
3. O art. 567, inciso II deve ser interpretado e aplicado em harmonia com o art. 42, § 1º, ambos do CPC. A regra do art. 42, § 1º, do CPC só pode ser afastada quando a cessão for efetivada antes do ajuizamento da demanda, caso em que o cessionário detém legitimidade ativa para ingressar em juízo porque lhe foram transferidos, com a cessão, todos os direitos, ações e pretensões pertencentes aos cedentes.
4. O cessionário de crédito reconhecido por sentença transitada em julgado só pode promover execução de decisão contra a Fazenda Pública se esta consentir expressamente com a cessão.
5. Apreciando caso similar, oriundo da mesma Ação Ordinária n.89.00.13622-4, a Primeira Turma desta Corte negou provimento ao Recurso Especial n. 803.629/RS, recorrente Indústria de Calçados Cairú Ltda - Massa Falida e outros, DJ 26/06/2006, não permitindo a inclusão das cessionárias no pólo ativo da ação executiva.
6. Precedentes: Resp 962.096/RS, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, julgado em 04/10/2007; Resp 803.629/RS, Primeira Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ 26/06/2006; REsp 331.369/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 05/11/2001.
7. Afasta-se o entendimento adotado nesta decisão quando há autorização constitucional para a cessão.
8. A conclusão final do voto condutor do julgamento do Tribunal a quo é da inexistência de prova robusta nos autos no sentido de indicar a existência concreta do crédito cedido, por meio de elementos contábeis incontroversos, submetidos à perícia judicial, de molde a evidenciar a verossimilhança inconteste do interesse postulado no processo.
9. Não procede a insurgência recursal atinente à invocada nulidade da decisão que revogou a decisão deferitória da substituição processual por violação dos artigos 471 e 473, do CPC. Conforme salientado no acórdão impugnado: "não há falar em preclusão pro judicato, pois não é impossível ao julgador a revogação da decisão anteriormente dispondo sobre a viabilidade das substituições processuais, porque se trata de questão de ordem pública, sem olvidar, nos termos do artigo 473 do CPC, tal instituto é aplicável somente entre as partes, não se estendendo ao julgador, quando mais se utiliza do poder de cautela para tutelar o interesse público."
10. Recurso especial não-provido.
Do voto do relator, transcreve-se:
Observo que a regra do art. 567, II, do CPC, embora não registre nenhuma restrição, há de ser interpretada em harmonia com o art. 42, § 1º, do CPC (O adquirente ou cessionário não poderá ingressar em juízo, substituindo o alienante, ou o cedente, sem que o consinta a parte contrária). Essa regra (art. 42, § 1º, do CPC) só pode ser afastada quando a cessão for efetivada antes do ajuizamento da demanda, caso em que o cessionário detém legitimidade ativa para ingressar em juízo, porque lhe foram transferidos com a cessão todos os direitos, ações e pretensões pertencentes aos cedentes, o que não ocorre nos autos.
Trago a nota de Theotônio Negrão, in Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, 36ª ed., p. 158, cuidando do art. 42, § 1º, do CPC:
Aplica-se esta disposição se o cessionário pretende substituir o cedente em ação já proposta. Se ainda não existe a ação, é o cessionário que tem qualidade para ingressar em juízo, porque com a cessão lhe foram transferidos todos os direitos, ações e pretensões que ao cedente cabiam contra o cedido (JTJ 322⁄219).
Ou seja: "O art. 42 do CPC restringe somente a cessão de direito ocorrida no curso do processo. Tal restrição não alcança aquelas cessões efetivadas antes de instaurada a relação processual. Estas últimas são plenamente eficazes" (CPC, art. 567, II)" (REsp. 331.369⁄SP, Rel. Min. Garcia Vieira, Primeira Turma, STJ, DJU de 4.3.02, p. 198).
A cessionária de crédito não tem legitimidade para promover a execução contra o devedor se a alienação do crédito litigioso foi a título particular, sem a ciência ou o consentimento da parte devedora (REsp 331.369⁄SP, Primeira Turma, julgado em 02.10.2001, DJ de 05.11.2001, entre partes o Município de São Paulo e CS Participações Ltda).
É bem verdade que há orientação posta em julgados deste STJ no sentido de, em se tratando de execução, não ser exigido o cumprimento do estabelecido no art. 42, § 1º, do CPC. Nessa linha, já me manifestei no REsp 284.190⁄SP, idem Min. Eliana Calmon no REsp 687.261⁄RS.
Reexaminando o tema, estou convicto de que o art. 567, II, do CPC, há de ser aplicado em harmonia com o art. 42, § 1º, do mesmo diploma, afastando-se o entendimento adotado nesta decisão quando houver autorização constitucional para a cessão.
3) Ingresso do Cessionário Após o Oferecimento de Embargos ou Impugnação à Execução Pelo Cedente. Legitimidade Passiva.
Sérgio Shimura, A cessão de Crédito e a Legitimidade Ativa na Execuçao, in Execução Civil e Cumprimento da Sentença, vol. 3, Ed. Método, 2009:
Se a cessão de crédito ocorrer após o ajuizamento da execução, pode suceder de o devedor executado já ter ofertado embargos contra o primitivo exequente. Por exemplo: A ajuíza execução contra B, que apresenta seus embargos do devedor. Após, A cede o crédito a X, que passa a ter legitimidade, superveniente, para prosseguir na execução. Como fica a legitimidade passiva na ação de embargos do devedor? Continua contra o A (cedente e primitivo credor legitimado) ou X (cessionário e atual legitimado)?
Cremos que, como os embargos têm caráter de ação de conhecimento, incide a regra do art. 42,§1º, CPC; vale dizer, nada impede que prossigam contra o cedente A, que passa a atuar como legitimado extraordinário, na defesa dos dos direitos do cessionário X. O raciocínio vale também para a fase de cumprimento da sentença e, pois, para a respectiva impugnação.
3.1) Repercussão do Problema da Natureza Jurídica da Impugnação à Execução Sobre a Questão
Partindo-se da premissa de que reside na “natureza jurídica” da impugnação o fundamento para a incidência do art. 42,§1º do CPC, então do dissenso sobre o tema decorrem as possibilidades de: (a) não ser aplicável o dispositivo em questão a essa insurgência e (b) ser aplicável apenas em certas hipóteses. Tais possibilidades são sustentáveis por haver doutrinadores que defendem não possuir a impugnação natureza de ação de conhecimento, e outros que sustentam a variabilidade de seu caráter, aferível segundo o conteúdo que por meio dela se veicule. Confira-se a respeito:
as opiniões de Araken de Assis e Luiz Guilherme Marinoni sobre a “natureza jurídica” da impugnação à execução de título judicial;
a opinião de Luiz Rodrigues Wambier, José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier, para quem a “natureza jurídica” da impugnação dependerá da matéria por meio dela arguida;
Arrematei em leilão um imovel de direitos creditorios oriundos de contratos de financiamento imobiliario qro saber se com esse contrato pagando itbi ja consigo transferir ? aguardo resposta.obrigado
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