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- ##check## Atualização do dia 27/01/2021
- Foi o texto abaixo publicado em 04/08/2008 para divulgar a opinião de nosso maior processualista, o saudoso e inesquecível José Carlos Barbosa Moreira, a propósito das indevidas restrições jurisprudenciais acerca do requisito do cabimento recursal. Identificava então o mestre, em primeiro lugar, hipóteses em que incorretamente se consideravam meros "despachos" pronunciamentos que, ao invés, ostentavam conteúdo decisório e consistiam, portanto, em decisões interlocutórias; apontava, em segundo lugar, casos nos quais era difícil a identificação do recurso cabível, seja por deficiência do texto legal, seja por impropriedade da própria decisão judicial (que o magistrado poderia, v.g., equivocadamente rotular de "sentença", induzindo a parte a interpor apelação, quando na verdade se tratava de interlocutória). Subsistem tais problemas sob a égide do CPC/2015, que acrescentou à equação uma nova variável, concernente à identificação (tornada difícil pela jurisprudência) do meio de impugnação das decisões interlocutórias proferidas na fase de conhecimento. Embora haja o legislador (bem ou mal, como se queira) expressamente confinado o cabimento do agravo de instrumento ao rol de hipóteses do art. 1012, ampliou-o o STJ por ocasião do julgamento dos Resps 1.696.396/MT e 1.704/520/MT (tema 988), quando consagrou o princípio da taxatividade mitigada. A linha divisória com que o Poder Legislativo nitidamente demarcou o território do agravo de instrumento no Código, e servia de fronteira com a impugnação mediante preliminar de apelação ou contrarrazões (art. 1.009, §1º), foi assim esfumada pelo Judiciário, turvando a visão do intérprete e do aplicador.
"(...)negar conhecimento a recurso é atitude correta - e altamente recomendável -, toda vez que esteja clara a ausência de qualquer dos requisitos de admissibilidade. Não devem os tribunais, contudo, exagerar na dose; por exemplo, arvorando em motivos de não-conhecimento circunstâncias de que o texto legal não cogita, nem mesmo implicitamente, agravando sem razão consistente exigências por ele feitas, ou apressando-se a interpretar em desfavor do recorrente dúvidas suscetíveis de suprimento.
(...)
Na perspectiva indicada por essas considerações, impende arrolar e analisar, sucintamente, algumas questões que vêm provocando controvérsia e tendo às vezes desate infeliz. Vamos passá-las em revista a propósito de quatro requisitos genéricos de admissibilidade dos recursos: o cabimento, a tempestividade, a regularidade formal e o preparo."
José Carlos Barbosa Moreira, Restrições Ilegítimas ao Conhecimento dos Recursos, in Temas de Direito Processual, 9a Série, Ed. Saraiva, 2007, p.p271-272, obra em que se baseia a tabela abaixo.
Requisito de Admissibilidade em Que se funda a Inadmissão do Recurso: Cabimento
Restrição Ilegítima ao Conhecimento | Exemplos | Fundamentos da Admissão |
Não admissão de recurso contra pronunciamento dotado conteúdo decisório, alegando tratar-se de despacho (de "mero" expediente) e, portanto, irrecorrível1 . | (colhidos da jurisprudência) - indeferimento de pedido para que sejam riscadas expressões lançadas nos autos2; | Ante a existência de conteúdo decisório, é cabível recurso desses pronunciamentos. |
Não admissão de recurso supostamente "equivocado", por se entender que outro seria o cabível, nas hipóteses em que há dúvida decorrente da falta de clareza do ordenamento jurídico ou do teor da própria decisão. | - juízo "a quo" denomina o pronunciamento de "sentença", sendo duvidoso o seu enquadramento na definição do art.162,§1º5 do CPC, "induzindo" o recorrente a interpor "apelação" (art. 5136), cujo cabimento é discutível. | Ante a dúvida objetiva(rectius: objetivamente justificável), deve o órgão, aplicando o princípio da fungibilidade, admitir o recurso interposto, ainda que entenda ser outro o cabível. Apenas nas hipóteses de erro grosseiro é legítima a inadmissão. Procedimento: 1) se houve apelação e o juízo a quo entende ser cabível o agravo, deve determinar o desentranhamento e remessa da petição ao órgão ad quem para que a processe como tal. - se o Tribunal entender acertada a opção originária do recorrente, deve determinar o retorno do instrumento ao primeiro grau. A providência pode ser adotada pelo próprio relator, aplicando-se analogicamente o art. 527, II7 do CPC. 2) Se foi interposto agravo de instrumento, e o Tribunal reputa cabível a apelação, deverá determinar a baixa ao juízo a "a quo". Também com base no art. 527,II, poderá o relator decidir a matéria sem consulta ao colegiado. |
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Notas
1. Art. 504 - Dos despachos não cabe recurso
2. Art. 15 - É defeso às partes e seus advogados empregar expressões injuriosas nos escritos apresentados no processo, cabendo ao juiz, de ofício ou a requerimento do ofendido, mandar riscá-las.
3. Art. 899 - Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é lícito ao autor completá-lo, dentro em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a prestação, cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato.
4. Art. 438 - A segunda perícia tem por objeto os mesmos fatos sobre que recaiu a primeira e destina-se a corrigir eventual omissão ou inexatidão dos resultados a que esta conduziu.
Art. 439 - A segunda perícia rege-se pelas disposições estabelecidas para a primeira.
Parágrafo único - A segunda perícia não substitui a primeira, cabendo ao juiz apreciar livremente o valor de uma e outra.
5. Art. 162 - Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos
§ 1º - Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei
6. Art. 513 - Da sentença caberá apelação (arts. 267 e 269).
7. Art. 527 - Recebido o agravo de instrumento no tribunal, e distribuído incontinenti, o relator:
(...)
II - converterá o agravo de instrumento em agravo retido, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, mandando remeter os autos ao juiz da causa; (Alterado pela L-011.187-2005)
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